domingo, 31 de maio de 2009

ESSAS PESSOAS- Por Maria Conceição -Nossa profª.

ESSAS PESSOAS
HÁ PESSOAS NESTE GRUPO QUE SÃO...

Amorosas
Grandes guerreiras
Gente com determinação
Pessoa humana e que faz o que ama, com inteligência rara e um poder de síntese maravilhoso.
Pessoa brincalhona e companheira de idas e vindas
Pessoas neste grupo são perseverantes, do tipo que faz duas coisas ao mesmo tempo.
Pessoa com quem a gente se identifica e que dá prazer de encontrar. Que tem capacidade de ser inspiração e força. Gente com quem se quer estar.
Pessoa companheira...inclusive do Estado, afinal 30 anos de serviço é parceria!
Pessoa que cuida de tudo, do tipo que quando precisa é só procurar para conversar.
Pessoa que sempre tem coisinha para contar. Pessoa preocupada com o colégio todo...da porta à sala e às pessoas...aquela que dá vigiadinha básica!
Há amigas inseparáveis; gente que dá prazer em conhece. Que tem bagagem, conhecimento, convicção do que é verdadeiro.
Pessoa humana, dinâmica, que dá vontade de estar junto. Gente com que se quer estar perto!
Pessoa do tipo gaúcha maravilhosa. Pessoa que é a própria expressão de equilíbrio...é ponto de fortalecimento!
Gente que deu e dá origem ao grupo, que possibilita conhecimento e liderança!
Pessoa dedicada e organizada. Pessoa comunicativa e dedicada.
Pessoa onde a dedicação é explícita.
Pessoa determinada, forte, que busca, que é batalhadora. Pessoa que transmite tranqüilidade e dedicação em tudo o que faz. Pessoa preocupada como outro. Pessoa parentética...aquela que é preocupada com a família, que é cuidadosa e atualizada como ser humano!
Pessoa especial com quem a gente se sente gratificada de estar junto!
Pessoa alegre e descontraída que transmite alegria onde quer que vá!
Pessoa que tem amor pela outra, que expressa companheirismo e dedicação...que traz a discussão ao grupo!
Gente é amigo de verdade! Pessoa espontânea e querida!
Tem até parente do tipo tia e sobrinha! Pessoa competente que precisa de paciência...gente de quem se pode falar o dia inteiro sem se cansar!
Pessoa com grande conhecimento!
Tem mocinha recém se formando...pessoa voluntária! Pessoa lutadora...que faz o que gosta e com quem é agradável conviver!
Pessoa que auxilia tecnologicamente, que é interativa, comunicativa, parceira!
Há gente dedicada, paciente, que traz conhecimento e olhar diferenciado ao grupo.
Há pessoas neste grupo que vive muito juntas, que fazem cursos juntas, graduação juntas, estão sempre juntas, decidem juntas e compartilham muito, sempre juntas!
Há pessoa do tipo grande guerreira que enfrenta tudo de cabeça erguida que luta e consegue as coisas!
Gente que é grande amiga!
Pessoas dignas de serem admiradas!
Pessoa organizada e perfeccionista. Pessoa amiga de quem se pode falar e com quem se pode falar de muitas coisas!
Gente que pedala e troca figurinhas! Pessoa humana, atuante, espírito de liderança!
Gente que dá prazer de conviver!
Aqui tem Gente que planta, que encanta
Essas são pessoas que fazem de um grupo espaço de viver!

Produção do grupo de Pós – Graduação - Núcleo:Garopaba – Curso de Gestão Escolar / 2009
Texto sistematizado pela professora Maria Conceição Coppete a partir da dinâmica de apresentação realizada na disciplina de Concepções Curriculares Atuais.
Profª: Mª Conceição Coppete (Cuca)
23/05/09

Pauta utilizada - Profª Maria Conceição Coppete

Autorização
Portaria MEC 786
Avenida Marechal Floriano, 947 – Centro – Lages/SC
CNPJ/MF – 82.152.315/0001-19


PAUTA PARA A DISCIPLINA: CONCEPÇÕES CURRICULARES ATUAIS
30/05/09

A nossa maior fraqueza reside em que temos a tendência a abandonar.
A maneira mais segura de conseguir os objetivos é sempre: tentar uma vez mais.
Thomas A.Edison

DIA/HORAS ATIVIDADES -
Sábado: Matutino
8h30min.
• Acolhida a partir da leitura dos textos: Essas Pessoas e Vida de Grupo; devolução dos crachás. Estabelecimento de relações entre o texto e os estudos prévios da disciplina.
• Devolução da produção realizada no encontro anterior.
9horas • Exposição dialogada: Currículo, Gestão Escolar e Prática pedagógica
10 horas • Intervalo
10h15min. • Continuação da atividade anterior
11h15min. • Atividade em pequenos grupos: texto referência: “Práticas curriculares emancipatórias no cotidiano escolar”
12 horas • Encerramento dos trabalhos do período matutino


Sábado:
Vespertino
13h15min. • Dinâmica: Barco salva-vidas e Sorteio de livro
• Estabelecimento de relações com as discussões feitas acerca do currículo e da gestão escolar, suas finalidades, valores e importância na escola.
13h40min. • Continuação da atividade anterior
14h20min. • Socialização da atividade a partir de Seminário ampliado
15h40min. • Vídeo: Os novos paradigmas da educação e debate
16h20min. • Mensagem e Avaliação final
16h45min. • Encerramento dos trabalhos

PLANO DE ENSINO UTILIZADO- Profª Maria conceição Coppete

Coordenação de Pós-Graduação
Instituição credenciada: Portaria MEC 2125 DE 16/06/2005
Núcleo: Florianópolis – Colégio Solução
Curso: Pós-Graduação “Lato Sensu”.
Especialização: Práticas Pedagógicas Interdisciplinares
Disciplina: CONCEPÇÕES CURRICULARES ATUAIS – carga horária: 40 horas


Nome completo do(a) professor: Maria Conceição Coppete
Título: Mestre ( ) Doutor (X) Mestre ( ) Especialista
Instituição pela qual obteve o título: Universidade do Estado de Santa Catarina - UDESC

1. EMENTA:

• Estudo crítico das diferentes visões de currículo evidenciando seu significado social e cultural na sociedade, bem como a concepção de escola e educação de uma sociedade e todo contexto histórico e cultural em que a produz. Conceito de currículo. Estudo das diferentes visões de currículo. Teorias curriculares. Currículo e sociedade numa abordagem interdisciplinar. Currículo como prática social e cultural. Currículo em ação; currículo oculto.

2. OBJETIVO GERAL:

• Conhecer as concepçoes curriculares atuais, com o intuito de ampliar a reflexão crítica, buscando habilidades e atitudes que estejam comprometidas com uma prática pedagógica inovadora e transformadora.

2.1OBJETIVOS ESPECÍFICOS
• Apropriar-se dos conceitos básicos acerca do currículo e sua relevância no cotidiano;
• analisar as principais teorias de currículo e suas implicações na prática pedagógica;
• reconhecer o currículo como política social e cultural, sabendo que toda prática pedagógica gravita em torno dele;
• entender o significado dos currículos formal, em ação e oculto, bem como a existência dos mesmos nas instituições escolares;
• estabelecer relações entre currículo e sociedade a partir de uma abordagem interdisciplinar;
• aprimorar os referenciais teóricos e a prática reflexiva no seu processode formação como profissional da educação.

2. CONTEÚDOS:
UNIDADE I – Olhares e Concepções sobre o Currículo
1.1. Conceitos e visões de currículo
1.2. Teorias curriculares
UNIDADE II –Os territórios multifacetados do currículo
2.1. Os paradigmas curriculares
2.2. Currículo e sociedade numa abordagem interdisciplinar
2.2. Currículo como política social
UNIDADE III – Especificidades do currículo como campo de práticas
3.1. Organização curricular
3.2. Currículo formal, em ação e oculto

4. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS:

• A disciplina será desenvolvida mediante aulas expositivas e dialogadas; leituras; atividades em duplas e pequenos grupos; debates; seminários; dinâmicas diversas; vídeos; músicas; produções textuais.


5. AVALIAÇÃO

6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS










6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
1. BÁSICA
UNIDADE I
Um repetente fala sobre currículo. Texto mimeo; s/d.
RAMAL, Andrea Cecília. Para ler e refletir... e quem sabe ousar. Texto mimeo; s/d.
MELLO, Helena Maria Billig. Reflexões sobre o Currículo e as práticas pedagógicas. In: MELLO, Ieda C. (Org.) Currículo Escolar: propósitos e práticas. Santa Cruz. EDUNISC, 1999; pp. 77-80.
UNIDADE II
FERRAÇO, Carlos Eduardo. Possibilidades para entender o currículo escolar. In: Revista Pátio. Fev/abr
2006, pp. 08-11.
SANCHO, Juana. Entrevista: currículo é tudo o que acontece na escola. In: Revista Pátio. Fev/abr
2006,pp.20-23.
CORTELA, Mário Sérgio. Os Novos paradigmas da Educação. Vídeo
UNIDADE III
SAVIANI, Nereide. O currículo em ação. In: Currículo – um desafio para o professor. Revista da Educação,
2002/2003. (apeoesp.org.br) O Portal da Educação.

OBS.: Outras referências bibliográficas poderão ser acrescidas e/ou substituídas ao longo da
realização da disciplina.

2. COMPLEMENTAR

APPLE, Michael W. Repensando Ideologia e Currículo. In: MOREIRA,A. F. SILVA,Tomaz Tadeu da (orgs.) Currículo, Cultura e Sociedade. 7ª Edição. São Paulo, 2002; p.39-57.
______ . Conhecimento oficial: A educação democrática numa era conservadora. Rio de Janeiro. Vozes; 1997.
BERTICELLI, Ireno Antonio. Currículo: Tendências e Filosofia. In: COSTA, Marisa Vorraber (org.) O Currículo nos limiares do contemporâneo. Rio de Janeiro. 3ª edição. DP & A; 2001.
CORAZZA, Sandra. O que quer um currículo? Pesquisas pós-críticas em educação. 3ªedição. Petrópolis, Rio de Janeiro. Vozes, 2001.
DANTAS, Jéferson. Projeto Histórico e Formação Docente no Maciço do Morro da Cruz. In: Fronteiras: Revista Catarinense de História. N.14. Florianópolis: UFSC/ANPUH/SC, maio 2006.
ENGUITA, Mariano. A face oculta da escola: Educação e trabalho no capitalismo. Porto Alegre. Artes Médicas; 1989.
FERRAZ, Marco. Coordenação pedagógica: funções e ações. In: Anais do 2º Congresso Internacional dos Expoentes na Educação. Curitiba – PR. Editora Gráfica expoente; 2002.
FREIRE, Paulo. A Educação na cidade. São Paulo. Cortez; 1991.
________. Pedagogia da Autonomia – saberes necessários à prática educativa. Editora paz e Terra. 1997.
FORQUIN, Jean-Claude. Escola e Cultura. As bases epistemológicas do conhecimento escolar. Porto Alegre. Artes Médicas Sul; 1993.
MACHADO, José Nilson. Educação: Projetos e Valores. São Paulo. Escrituras Editora; 2000. (Coleção ensaios transversais)
MENEGOLA, Maximiliano & SANTÃNNA, Ilza M. Por que Planejar? Como Planejar? Petrópolis – RJ. 11ª edição. Vozes; 2001.
MOREIRA, Antônio Flávio Barbosa (Org.) Currículo: questões atuais. São Paulo. Papirus; 1997.
NÓVOA, Antonio (org.) Profissão professor. Porto. Ed. Porto, 1999.
PERRENOUD, Fhilippe. A Pedagogia na Escola das Diferenças – Fragmentos de uma sociologia do fracasso. Tradução:Cláudia Schilling. Porto Alegre. Artmed; 2001.
SACRISTAN, Gimeno. Um só conceito ou diversas concepções de currículo? In: GÓMEZ, A. I. Pérez e SACRISTAN, Gimeno. Compreender e transformar o ensino. Porto Alegre. 4ª edição. Artes Médicas; 1998.
__________. O Currículo: Uma reflexão sobre a Prática. Porto Alegre. 3ª edição. Artmed; 2000.
SILVA, Tomas Tadeu da. (org.) Currículo, cultura e sociedade. São Paulo. 2ª edição. Cortez; 1995.
__________. Documentos de identidade. Uma introdução às teorias do Currículo. Belo Horizonte. Autêntica; 2002.
YOUNG, Michael F. D. O Currículo do futuro: Da Nova Sociologia da Educação a uma teoria crítica do aprendizado. Campinas. São Paulo. Papirus; 2000
ZABALA, Antoni. A Prática Educativa. Como ensinar. Porto Alegre. Artmed, 1998.

GESTÃO ESCOLAR E CURRÍCULO: Elementos para Análise

PROFESSORA MARIA CONCEIÇÃO COPPETE.

DISCIPLINA: Concepções Curriculares Atuais
Explorando alguns conceitos importantes de
GESTÃO ESCOLAR E CURRÍCULO: Elementos para Análise

Gestão Escolar - significa dar direção ao processo de organização e funcionamento da escola, comprometida com a formação do cidadão. Não qualquer formação, mas justamente aquela que apresenta a orientação em âmbito mais geral de um processo: direção de mudanças a serem efetuadas.

Currículo – constituiu um dos fatores que maior influência possui na qualidade do ensino. Não existe uma noção, mas várias noções de currículo, tantas quantas as perspectivas adotadas. O currículo continua a ser frequentemente identificado, com o "plano de estudo". Currículo significa, neste caso, pouco mais do que o elenco e a sequência de matérias propostas para um dado ciclo de estudos, um nível de escolaridade ou um curso, cuja frequência e conclusão conduzem o aluno a graduar-se nesse ciclo, nível ou curso. "Em termos práticos, como escreve Ribeiro (1989), o plano curricular concretiza-se na atribuição de tempos letivos semanais a cada uma das disciplinas que o integram, de acordo com o seu peso relativo no conjunto dessas matérias e nos vários anos de escolaridade que tal plano pode contemplar". Este conceito de currículo, muito próximo do conceito de programa, como foi formulado por Bobbit (1922), evoluiu para um conceito mais amplo que privilegia o contexto escolar e todos os fatores que nele interferem. Procurando traduzir estas novas concepções Ribeiro (1989), propôs a seguinte definição mais operacional de currículo : "Plano estruturado de ensino-aprendizagem, incluindo objetivos ou resultados de aprendizagem a alcançar, matérias ou conteúdos a ensinar, processos ou experiências de aprendizagem a promover". Mas o currículo não é apenas planificação, mas também a prática em que se estabelece o diálogo entre os agentes sociais, os técnicos, as famílias, os professores e os alunos. O currículo é determinado pelo contexto, e nele adquire diferentes sentidos conforme os diversos protagonistas.
Que é planejamento e qual a sua importância na organização e gestão da escola?

O processo e o exercício de planejar constituem uma antecipação da prática, ou seja, planejar é prever e programar as ações e os resultados desejados, possibilitando à equipe gestora a tomada de decisões.
Sem planejamento, as ações dos diversos atores da escola irão ocorrer ao sabor das circunstâncias, com base no improviso ou na reprodução mecânica de planos anteriores e sem avaliar os resultados do trabalho.
O planejamento escolar não pode ser conduzido de forma autoritária e centralizadora, uma vez que se pretende instituir uma cultura mais democrática e participativa nos processos desenvolvidos na escola.

Todo programa pedagógico, todo currículo, todo método pedagógico tem uma dimensão política. Por trás do que às vezes parece ser uma escolha técnica, operam valores éticos e políticos, uma certa representação do ser humano, da sociedade, das relações que cada um deve manter com o mundo, com o outro, consigo mesmo.”
(Bernard Charlot)

Gestão democrática e democracia social

Para os especialistas em Gestão Educacional e Políticas Públicas, tais como Paro (2000): "a participação dos usuários na gestão da escola inscreve-se, inicialmente, como um instrumento a que a população deve ter acesso para exercer seu direito de cidadania".
Isto porque, à medida que a sociedade se democratiza, e como condição dessa democratização, é preciso que se democratizem as instituições que compõem a própria sociedade, ultrapassando os limites da chamada democracia política e construindo aquilo que Norberto Bobbio (1989) chama de democracia social.
Tal processo de "democratização" gera o que podemos denominar apartheid educacional, pois à medida que a Gestão Participativa engendra novos horizontes para a educação brasileira, deparamo-nos com o Poder Público, que muitas vezes cria barreiras para que haja a desburocratização no âmbito escolar, promovendo a cidadania e a inclusão social, de forma autônoma a Gestão Participativa.
Assim, o caminho para a real "democratização da sociedade precisa passar pela ocupação "de novos espaços, isto é, de espaços até agora dominados por organização de tipo hierárquico ou burocrático" (BOBBIO, 1989, p. 55).

Gestão democrática e liberdade: do que estamos falando?

Falar de gestão democrática significa, também, falar de liberdade, no sentido mais explícito do conceito de liberdade em comunidade. Na acepção do Aurélio, é o mesmo que “poder agir no seio de uma sociedade, segundo a própria determinação, dentro dos limites impostos por normas definidas”. De acordo com Vitor Paro (2000):

Se os fins humanos (sociais) da educação se relacionam com a liberdade, então é necessário que se providenciem as condições para que aqueles, cujos interesses a escola deve atender, participem democraticamente da tomada de decisões que dizem respeito aos destinos da escola e a sua administração.

Nesse sentido, a democracia passa a ser entendida como uma maneira de permitir que todos os que estão diretamente interessados ou são diretamente atingidos por uma decisão, seja ela qual for, possam participar dessa tomada de decisão.
Ao tratarmos da Gestão Escolar, devemos priorizar, principalmente, os educandos, pois eles são a essência do Projeto Educacional e da Filosofia de Ensino que se adota no espaço escolar.
No entanto, o Sistema Educacional brasileiro não prioriza este segmento como deveria, pois as Políticas Públicas que permeiam o setor ainda vêem o aluno como secundário.

Escola, Currículo e Gestão: desafios pós-modernos

A escola é o principal espaço das transformações sociais, pois por meio das propostas nela inseridas, consegue-se promover uma reestruturação cognitiva e crítica, tanto nos educandos, quanto nos educadores. A práxis pedagógica intervém nas transformações decorrentes da auto-reflexão do educador frente ao seu compromisso de promover educação com qualidade.
Para que estas premissas sejam válidas, faz-se necessário que o educador seja comprometido com seu "quefazer", orientando-se e procurando oferecer alternativas que viabilizem uma educação crítico-participativa, como defende Paulo Freire (2000).
O Planejamento e a Gestão Escolar participativos são as principais ferramentas que promovem uma verdadeira revolução na prática pedagógica e na visão estratégica de uma Instituição Escolar.

Juntos, na escola, Currículo e Gestão

Como estamos tratando de Currículo e Gestão, não se pode desvincular o importante papel do docente, pois é este que conseguirá trazer, para os educandos, as noções essenciais que os ajudarão a driblar os desafios que encontrarão quando saírem da escola. Enquanto realiza as atividades escolares, o aluno absorve vivências e sensações e solidifica a sua personalidade.
Se a Escola não possui PPP, nem planos de trabalho, como missão ou visão estratégica, e preparar os educandos, apenas, para o "vestibular", isto faz com que se torne mais difícil alcançar a almejada educação de qualidade.

Como acompanhar o processo escolar, sem falar de Currículo e Gestão?

 Como entender como ocorre a aprendizagem dos alunos, como estão sendo organizados os conteúdos, mediante que proposta?
 Quais os mecanismos usados para intensificar a aprendizagem ou as ações que a escola desenvolve?
 Como educandos e educadores estão articulados na Gestão administrativa?

Perguntas como essas costumam pairar sob o cotidiano das escolas, mas, nem sempre, as respostas são obtidas.

O "burocratismo e a centralização" costumam estar imbricados, impedindo que a escola prepare o cidadão para os desafios pós-modernos. Muitas vezes, a escola se concentra em apresentar conteúdos que não possuem relevância do ponto de vista social.

Referência: Curso Experimental VerdEAD
http://www.moodle.ufba.br/mod/book/view.php?id=10244&chapterid=9696

OS SABERES E OS FAZERES NA ESCOLA: O CURRÍCULO E SUAS TEORIAS

PROFESSORA MARIA CONCEIÇÃO COPPETE
OS SABERES E OS FAZERES NA ESCOLA: O CURRÍCULO E SUAS TEORIAS
Quais as principais teorias do currículo e suas implicações na prática pedagógica?

Primeira noção: Curriculum Vitae

Currículo é uma construção social, feita por pessoas em um determinado momento histórico.



O que é Gestão Escolar?
Gestão Escolar significa dar direção ao processo de organização e funcionamento da escola, comprometida com a formação do cidadão. Não qualquer formação, mas justamente aquela que apresenta a orientação em âmbito mais geral de um processo: direção de mudanças a serem efetuadas.

Que relações podemos estabelecer entre Gestão Escolar e Currículo?
O currículo constituiu um dos fatores que maior influência possui na qualidade do ensino. 
Não existe uma noção, mas várias noções de currículo, tantas quantas as perspectivas adotadas.

O currículo continua a ser frequentemente identificado, com o "plano de estudo".
Currículo significa, neste caso, pouco mais do que o elenco  e a sequência  de matérias propostas para um dado ciclo de estudos, um nível de escolaridade ou um curso, cuja frequência e conclusão conduzem o aluno a graduar-se nesse ciclo, nível ou curso.
O Currículo e as relações de Poder
O Currículo não é um instrumento passivo, mas uma força ativa que pode, inclusive, servir para legitimar as ideologias e os sistemas sociais e econômicos tão estreitamente ligados a escola. Não possui neutralidade.
É também o resultado de uma seleção feita a partir de um universo mais amplo de conhecimentos que está diretamente vinculado ao que somos e ao que nos tornamos.


Em suma:

currículo é uma construção social;
pensá-lo implica considerar relações de poder.

O QUE OS ALUNOS DEVEM SABER?
A seguir, estudaremos as teorias do currículo e a tentativa de darem respostas à questão levantada tendo em vista as demandas sociais, políticas, econômicas e culturais do contexto no qual foram elaboradas.

É importante compreender também, “o como”, o “porquê” e o “para quem” de cada uma das respostas dadas.




ENTRE TRAJETOS DE TEORIAS PÓS-CRÍTICAS

Destacam os novos traçados que perpassam especialmente a cultura, a identidade e o poder. Questionam o Currículo para quem?
Os Estudos Culturais representam os grupos que tem na cultura a possibilidade de pensar as diferenças, o outro em suas múltiplas dimensões.

A diferença é que esse poder nas Teorias Pós-Críticas passa a ser descentralizado; está em vários lugares como se fosse uma rede a entrelaçar todo o tecido social. Pode transformar-se, mas nunca desaparecer.






Proposta de Trabalho Texto-referência: “Gestão Escolar e Currículo: elementos para análise”
1. Leitura e discussão do texto, buscando estabelecer relações entre o conteúdo da aula expositiva dialogada e as idéias apresentadas no texto em questão.

2. Elaborar uma síntese da discussão realizada e apresentá-la ao grande grupo por meio de um recurso criativo (paródia, dramatização, música, entre outros...)




O QUE SUSTENTA OS SABERES E FAZERES NA ESCOLA: OS PROTAGONISTAS DO CURRÍCULO
Todo Currículo contempla vários componentes:

Que ensinar?

Quando ensinar?

Como ensinar?

Que...Quando...Como...Avaliar?

O QUE É ENSINAR ?

“Educar, ensinar, é colocar alguém em presença de certos elementos da cultura a fim de que ele(a) deles se nutra, que ele(a) os incorpore à sua substância, que ele(a) construa sua identidade intelectual e pessoal em função deles.” (FORQUIN,1993:168)

O QUE É APRENDER ?

“Aprender é uma atividade complexa, frágil, que mobiliza a imagem de si mesmo, o fantasma, a desconfiança, a criatividade, o gosto pelo risco e pela exploração [investigação], a angústia, o desejo, a identidade, aspectos fundamentais no âmbito pessoal e cultural.” (PERRENOUD, 2001:24)









Você sabe o que são paradigmas?

Chamamos de paradigmas às estruturas de pensamento que, de modo quase que inconsciente, comandam nosso modo de ser, de olhar, de viver, de fazer, de falar sobre as coisas e sobre nós mesmos. São os nossos sistemas mentais, que filtram toda a informação que recebemos: ignoramos, censuramos, rejeitamos, desintegramos o que não queremos saber. Não os entendemos como modelos, rígidos e acabados, mas como horizontes, que se ampliam e se modificam a cada passo dado, ou teias de significados, sempre se re-tecendo e re-articulando.

(AZIBEIRO apud MELLO & POCOVI, 2002;pag. 29)
Paradigmas ONTEM HOJE
ONTEM HOJE

O PPP é o plano global de uma instituição escolar. Pode ser entendido como a sistematização de um processo de planejamento participativo, quer dizer, elaborado coletivamente de maneira a envolver toda a comunidade escolar.



Uma forma de relacionar Currículo, Gestão Escolar e PPP pode ser a partir do conceito de Projeto. “Um projeto significa sempre a antecipação de uma ação, envolvendo uma referência ao futuro” (Machado, 2000:05).

O projeto traz em si também a idéia de movimento. Currículo e Projeto, pensados numa perspectiva de construção, eles são conceitos abertos e de certa forma inacabados e contínuos.


Reconceitualizando o Currículo
[...] depois das teorias críticas e pós-críticas, não podemos olhar o currículo com a mesma inocência de antes.O currículo tem significados que vão muito além daqueles aos quais as teorias tradicionais nos confinaram.O currículo é lugar, espaço, território.O currículo é relação de poder.O currículo é autobigrafia, nossa vida, curriculum vitae: no currículo se forja nossa identidade.O currículo é texto, discurso, documento.O currículo é documento de identidade. Tomaz Tadeu da Silva


AUTO-AVALIAÇÃO

sábado, 16 de maio de 2009

O PAPEL DAS RELAÇÕES SOCIAIS NO DESENVOLVIMENTO INFANTIL

TÍTULO: O PAPEL DAS RELAÇÕES SOCIAIS NO DESENVOLVIMENTO INFANTIL

Altino José Martins Filho

Resumo: Este artigo realiza a discussão sobre o papel das relações sociais e o desenvolvimento infantil. Apresenta como objetivo principal fazer uma análise crítica dos pressupostos teóricos contemporâneos que supervalorizam o processo educativo escolar baseado em atividades espontâneas, bem como, pretende pensar e refletir sobre as bases que secundarizam o papel do professor nas relações sociais em contextos de educação infantil. Neste sentido, as discussões estão centradas em torno do trabalho pedagógico do professor da educação infantil e de algumas definições subjacentes da chamada pedagogia da infância. Oferece, então, pistas para a valorização da mediação qualificada e intencionalisada do professor no contexto escolar infantil.

Abstract: This article carries through the quarrel on the paper of the social relations and the infantile development. He presents as objective main to make a critical analysis of the estimated theoreticians contemporaries who supervalue the established pertaining to school educative process in spontaneous activities, as well as, he intends to think and to reflect on the bases that secundarizam the paper of the professor in the social relations in contexts of infantile education. In this direction, the quarrels are centered around the pedagogical work of the professor of the infantile education and some underlying definitions of the pedagogia call of infancy. It offers, then, tracks for the valuation of the qualified and intencionalisada mediation of the professor in the infantile pertaining to school context.

Palavras-Chave: Socialização, Mediação, Professor, Educação Infantil

Key-Words: Socialization, Mediation, Professor, Infantile Education


O Papel das Relações Sociais no Desenvolvimento Infantil


Como Abertura

Humanização é o processo
Que confirma no homem aqueles traços
Que reputamos essenciais, como o
Exercício da reflexão,
A aquisição do saber,
A boa disposição pra com o próximo,
O afinamento das emoções,
A capacidade de penetrar nos problemas da vida,
O senso da beleza,
A percepção da complexidade do mundo e dos seres,
O cultivo do humor.
A literatura desenvolve em nós
A cota de humanidade
Na medida em que nos torna mais compreensivos
E abertos para a natureza, a sociedade, o semelhante.
(ANTÔNIO CÂNDIDO, 08/2006)


São abundantes os trabalhos na área da educação infantil que fazem referência às teorias e práticas pedagógicas que centram sua atenção nas vivências, no cotidiano, nas necessidades, nos desejos e nas atividades espontâneas das próprias crianças. Tais abordagens são compostas por um conjunto de práticas e preceitos pedagógicos que vêm seduzindo uma gama bastante grande de professores e pesquisadores, já que está na moda defender uma pedagogia que descentralize o foco – do adulto para a criança. Todavia, indicamos que em muitos casos, este extremado centramento na criança, prescreve que a interferência direta do adulto é prejudicial ao desenvolvimento da criança, quase como se as mesmas tivessem poderes mágicos para serem agentes de suas próprias vidas.
Neste estudo, temos como objetivo fazer uma análise crítica dos pressupostos teóricos atuais que supervalorizam o processo educativo escolar baseado em atividades espontâneas das crianças, bem como, pretende pensar e refletir sobre a secundarização do papel do professor nas relações sociais com as crianças. Procuraremos enfatizar a importância da figura do professor para o desenvolvimento infantil, ou seja, sua atuação como sendo de primordial importância para o desenvolvimento do psiquismo humano da criança; neste sentido, as discussões serão centradas em torno do trabalho pedagógico do professor e do papel das relações sociais no desenvolvimento infantil. O texto apresenta-se subdividido em três partes: a primeira dedica-se a analisar de forma sucinta o papel das relações sociais no desenvolvimento infantil; a segunda parte discorre a respeito do percurso da concepção das relações sociais na produção teórica da educação infantil e a desvalorização da mediação do professor; a terceira parte levanta alguns argumentos conclusivos indicando a mediação com atividade primordial do professor.

As Relações Sociais e o Desenvolvimento Infantil

Há, sem dúvida, tendências pedagógicas que procuram centrar as propostas educativas nas manifestações das próprias crianças, propagando idéias que a dimensão imaginativa, a produção cultural infantil, o desenvolvimento das crianças e as relações sociais, constituem-se independente de um ambiente produtivo de mediações qualificadas pelo professor.

Torna-se visível nas assertivas de alguns autores da área da educação infantil a extremada valorização da relação criança-criança em detrimento da mediação qualificada dos professores nas relações sociais. Para nós, isso requer um olhar crítico e atento ao papel das relações sociais no desenvolvimento infantil. Pois as crianças não vivem em um vazio social e não estão num mundo à parte dos adultos. Desta forma, as fragilidades, as turbulências, a falta de valores humanos, o esvaziamento do conhecimento e do ato de criação cultural do mundo contemporâneo, também são vividos pelas crianças. Assim, ao defendermos que as instituições de educação infantil são espaços para as relações sociais entre as próprias crianças, não podemos cair em uma “fetichização da infância, o que nos levaria a total rendição à individualidade alienada desde a mais tenra idade”, como aponta Duarte (2004, p. 229). Isso quer dizer que o “desenvolvimento social da criança, mais do que inserção dela na sociedade, é inserção do social nela, para torná-la um ser na própria sociedade” (Martins Filho, 2006).
Assim, concordar com propostas que consideram as crianças produtoras de culturas, sujeitos ativos nos processos sociais, co-produtoras de conhecimentos e de identidade que as convertem num ser humano, para nós, é diferente de considerá-las atores de seu próprio destino, supervalorizá-las em si mesmo. Não é possível aceitar que as crianças sejam confinadas a isolamento do universo social dos adultos. Todavia, extrapolar as concepções que abreviam as relações sociais do patamar criança-criança, é mostrar a complexidade da variação das relações sociais no universo social e cultural do humano. Nas palavras de Arce (2004, p.164), “é ir contra a inserção da criança na vida social, como um processo natural, universal e imutável, não deixando aparecer seu caráter histórico”.
Muitos aspectos característicos da nossa compreensão consideram que as crianças e os adultos devem ser vistos como uma multiplicidade de seres em formação, “incompletos e dependentes, e é necessário superar o mito da pessoa autônoma e independente, como se fosse possível não pertencermos a uma complexa teia de interdependências” (Delgado e Müller, 2005). Em relação às crianças, não abrimos mão do fato de que são seres em formação e que, por isso, necessitam do cuidado, proteção, atenção e de um desenvolvimento educacional, cultural e social dos adultos frente aos desafios que o mundo lhes apresenta. A partir de uma abordagem histórico-cultural, já propagada por muito estudiosos marxistas, defendemos que o ser humano se constitui como síntese de múltiplas determinações, estando seu desenvolvimento e sua própria humanidade interligados a um conjunto de relações sociais.
Neste caso, valorizar e se ater às relações sociais das crianças em sua singularidade, não significa desvinculá-la das determinações sociais mais amplas, é sim a possibilidade de poder entender essa especificidade, que para nós, significa expressão de uma totalidade maior. Assim, o fato de buscarmos superar as concepções que centram o foco somente no ensino e no professor, não pode nos levar a uma negação da presença do professor e do processo de ensino-aprendizagem, secundarizando o papel das relações sociais desses sujeitos no desenvolvimento das crianças. Como afirma Duarte (2004, p.250), “não existe uma essência humana independente da atividade histórica dos seres humanos, da mesma forma que a humanidade não está imediatamente dada nos indivíduos singulares”. Por usa vez, os processos de apropriação do mundo dos objetos humanos, da cultura humana, não podem realizar-se sem a mediação de outros indivíduos, ou seja, sem a participação do próprio homem, de um indivíduo que transmita, direta ou intencionalmente, o significado social contido nos elementos materiais e simbólicos de nossa cultura (Rossler, 2006). Daí a importância de afirmar o papel das relações sociais no desenvolvimento infantil, acentuando, neste caso, o professor como principal mediador entre os processos de objetivação e apropriação para que as crianças se autoproduzem e se reproduzam.
Ao trazer a valorização das relações sociais entre o professor e as crianças pretendemos romper com uma educação escolar marcada por abordagens apoiadas em didáticas e técnicas pedagógicas, que instrumentalizam e alienam a educação das crianças para uma formação humana calcada no viés da submissão e subordinação. Assim, temos um grande desafio, que é não subestimar as crianças considerando-as incapazes, nem superestimá-las atribuindo-lhes comportamentos muito além de suas capacidades e condições emocionais. Nosso alerta caminha no sentido de criticar a extremada valorização das relações sociais que se dão entre as próprias crianças, pois em nossa compreensão, temos que ter cuidado para não cairmos num desamparo, abandono, nem exigir um comportamento de quem ainda não o tem para oferecer, pois dessa forma estaríamos negando a proteção da criança perante o mundo exigente e difícil.

Percurso da Concepção das Relações Sociais na Educação Infantil: A Desvalorização do Professor nos Processos de Socialização

Para apresentar o percurso da concepção das relações sociais que domina a área da educação infantil e que tem dado suporte teórico a chamada pedagogia da infância, iremos analisar alguns pressupostos teóricos de dois texto de Ana Lúcia Goulart de Faria – professora da Universidade Estadual de Campinas/Unicamp –, por considerar seus escritos o alicerce do discurso hegemônico na educação infantil. Faria constrói seu arcabouço teórico apoiada na bibliografia italiana, após terminar seu doutorado sanduíche na Itália, a autora tem divulgado intensamente tal produção no âmbito brasileiro, suas propostas têm servido de referência para muito pesquisadores e professores na área da educação infantil.
No texto “Políticas de Regulação, Pesquisa e Pedagogia na Educação Infantil”, Faria de maneira breve, faz o mapa da trajetória da educação infantil no Brasil. Para a autora é entrando na dimensão da transgressão que a educação infantil vem construindo e consolidando a “Pedagogia da Infância” ou mais restritamente “Pedagogia da Educação Infantil”, a qual entra em cena pelo viés dos direitos das crianças. De acordo com as palavras da autora,

Somadas às pesquisas [...] produto do movimento feminista, totalmente inovadoras ao investigarem a produção das culturas infantis entre as crianças pequenas nos espaços públicos coletivos de educação instituicionalizada, temos as bases teóricas e científicas que nos orientam hoje ao entender as necessidades e os desejos das crianças (FARIA, 2005, p.1014).

Antes de analisarmos os extratos do texto de Faria, é importante localizar que no Brasil, a Educação Infantil constitui a primeira etapa da Educação Básica a partir da promulgação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDBEN 9394/96. Essa legislação assim como outras leis recentes a respeito da infância, “são conseqüência da Constituição Federal de 1988 que definiu, em relação à criança, a doutrina que toma a criança como sujeito de direitos” (Stemmer, 2006, p.25). A partir destas duas definições no âmbito da legislação, assistimos muitos teóricos da educação infantil realizarem uma defesa em prol da cidadania e do respeito às crianças, o que leva alguns autores, como é o caso de Faria (2005a e b), centrarem o foco da educação nas próprias crianças, como se o que elas elaborassem fosse auto-suficiente para seu desenvolvimento. Tal referência tem apostado intensamente na desescolarização da educação infantil e por conseqüência, vem também, secundarizando o papel dos professores no desenvolvimento infantil.
Voltando a análise do texto de Faria, importa ressaltar que para a autora, ao compreendermos as necessidades, os desejos e os interesses das crianças, estaríamos construindo as bases teóricas e científicas da área da educação infantil. O reconhecimento das crianças enquanto sujeitos de direitos, neste caso, perpassa pela libertada das mesmas construírem suas próprias culturas infantis, como se vivem em um oásis no deserto da própria sociedade. Parecê-nos que descentralizar o foco do professor, do ensino, dos conteúdos e da didática para a autonomia e liberdade de expressão das crianças, é suficiente para construirmos uma pedagogia que considera a criança como protagonista central das relações educativas. Neste caso, é que as relações sociais são defendidas, pelo grupo de intelectuais da área da educação infantil, como algo que se dá somente entre as crianças, ou senão, valorizam somente as relações das crianças entre si. Para nós, ao contrário, a extremada valorização das relações sociais no pilar criança-criança, não é suficiente para respeitarmos os direitos sociais das crianças e nem muito menos contribuirmos de maneira positiva para seu desenvolvimento integral, de maneira mais ampla, para sua formação humana plena.
Acompanhando a produção teórica nacional no campo da Educação Infantil, é possível perceber que, a busca pela superação de planos, programas e currículos educacionais padronizados, acaba sendo produto de uma inadequada compreensão sobre o papel do/a professor/a e o próprio papel das instituições. Pois, ao negarem a educação nos moldes da burguesia, educação que é hegemônica no cenário mundial, a qual aliena os sujeitos aos princípios do capitalismo e a dominação do capital e do mercado, acabam violentando e descaracterizando o processo de ensino-aprendizagem para as escolas das camadas populares.
Em nossa opinião, entre tantas desqualificações, o que realmente merece ser problematizado, é o desmerecimento da mediação do professor nos processos de socialização, reduzindo sua interferência na sala de aula a uma mera participação ou acompanhamento das relações sociais que se dão entre as crianças. Parecê-nos que a máxima em relação ao papel do professor no seguimento da educação infantil, é considerá-lo como apenas mais um participante e membro do processo educativo, no qual o professor é relegado para um discreto segundo plano no contexto educacional e por conseqüência, nas relações sociais travadas entre as duas categorias de atores – adultos e crianças. Por outro lado, as relações sociais dos professores são levadas ao patamar das crianças, as quais passam a ser responsáveis juntamente com ele pelo seu próprio desenvolvimento educacional, social e cultural. Tais proposições sobre o papel das relações sociais, do nosso ponto de vista, negam a mediação qualificada do professor como referência principal para o desenvolvimento infantil.
Isto dificulta de alguma maneira, a construção da profissão de/a professor/a de crianças e a própria definição do perfil profissional no campo da educação infantil, haja vista que traz uma simplificação e excessiva abstração do trabalho educativo do professor. Esse debate sobre o papel do profissional da infância, é considerado aqui, como algo equivocado desde seu princípio. Nesta abordagem, o professor quase desaparece, pois ele é apenas uma espécie de observador, atuando com práticas de ajustamento social ou apenas para resolver problemas individualistas que se dão entre as crianças, que também são vista em suas individualidades, sem referência a sua classe econômica e seu contexto histórico. Isto nos soa muito estranho e mesmo concordando com alguns pressupostos teóricos de Faria, nos faz neste caso, criticá-la, questioná-la e provocá-la!
Em essência, não compreendemos como as crianças podem se formar, sem um papel ativo da educação escolar, sem uma mediação qualificada e intencionalizada de ensino-aprendizagem do/a professor/a no desenvolvimento das mesmas. Na seqüência trazemos alguns excertos do texto de Faria (2005b) que nega o papel do professor como mediador da educação das crianças e transmissor de conhecimentos. Nestes, para a autora:

Pedagogia da educação infantil sem conteúdo. (Idem, p.126).
(...) que o professor não dá aula e que a criança não é aluno, que a pedagogia não é centrada no professor (Idem, p.130).
E vou estabelecendo uma relação nova que não é de filho para com a mãe, não é de enfermeira, não é de professora para com o aluno, é de uma criança para com outro adulto (Idem, p.132). Então essa visão da criança capaz de múltiplas relações, portadora de história, produtora de cultura e sujeito de direitos faz a gente perguntar: o que as crianças vão fazer comigo [referindo-se ao professor] lá na creche (...) (Idem, p.132).
É dificílimo ser professora de criança de 0 a 6 anos sem copiar a casa, a escola ou o hospital, porque é uma outra profissão. Professora de creche, professora de pré-escola não é a mesma profissão de professora que dá aula (Idem, p.138).

Para nós o conhecimento historicamente acumulado e objetivado pela sociedade é indispensável à educação escolar, mesmo quando se tem criança de 0 a 6 anos, pois deve agir de maneira ativa na formação das crianças. Ou melhor, mas ainda importante, é que os conteúdos escolares dirijam-se ao que ainda não está formado na criança, contribuindo ativamente em seu processo de constituição, na formação dos sujeitos de pouco idade – as crianças. Compreendemos ser está à tarefa mediadora do professor de qualquer nível de ensino. Analisando as passagens do texto de Faria (2005b) é curioso que este discurso da negação do professor é quase um consenso dentre os pesquisadores da área da educação infantil, justamente em um período em que a criança está iniciando uma interação com o mundo e com a cultura. Porque negar a mediação do professor neste processo? Porque reduzir as interações das crianças ao pilar criança-criança? Porque desvalorizar o papel das relações sociais dos adultos para as crianças? Porque afirmar exacerbadamente que professor da educação infantil é uma profissão a ser inventada? Uma profissão que não é professor e que nem pode ensinar?
O discurso que vimos no plano teórico, demonstrado aqui pelos textos de Faria (2005 a e b), tem sua repercussão na prática dos professores, pois assistimos abertamente professores desabafarem que não sabem mais como agir pedagogicamente na educação infantil. Trazem dúvidas que questionam o seguinte: “Pois é, se a relação crianças e adultos na creche não é de mãe, não é de enfermeira, não é de cuidadora e muito menos de professora, qual relação vamos travar com as crianças? Qual relação é considerada aceitável? Qual nosso papel na educação infantil, enquanto profissional do magistério? (Depoimento de uma professora de educação infantil em conversa informal) Para estas questões, podemos analisar nas passagens citadas do texto de Faria (2005b), que não há definições e nem esclarecimentos. Parecê-nos que a idéia é mesmo deixar submerso a indefinição do papel do professor da educação infantil. A autora entrega-se a um ecletismo pragmático, recortando idéias de outras teorias de um outro contexto histórico e cultural, neste caso, dos italianos. Detectamos claramente a desqualificação da figura do professor e da educação escolar, tal negação é explicita abertamente pela autora, que não é a única na área. A autora chega a duvidar do próprio uso da palavra “professor”, percebemos em nossas leituras que não há um consenso quanto à adequação ou não desse termo, posto que para a autora ele carrega “resquícios” da idéia de educação escolar e de alguém que ensina.
Para Stemmer (2006, p.53) a disparidade dos termos para se referir à educação infantil vai além dos rótulos; implica em diferenças tanto dos objetivos e práticas pedagógicas, quanto das modalidades de prestação desses serviços. Essa questão não é puramente conceitual e teórica, está vinculada, entre outras coisas, às responsabilidades institucionais e políticas públicas dirigidas à educação infantil.
Do nosso ponto de visto, realmente o que este discurso pedagógico faz é propagar a alienação. Arce (2005, p.164) explica que esse tipo de discurso pedagógico torna a inserção da criança na vida social um processo natural, universal e imutável, não deixando aparecer seu caráter histórico, não transparecendo que este fato é uma construção social fruto do próprio homem e do modo de produção que rege a sociedade. O que parece ser uma valorização real da criança e da infância constitui-se em recurso ideológico de desvalorização da educação escolar e de alienação dos indivíduos desde a mais tenra idade.
Neste ponto, voltamo-nos para as indicações de Duarte (1996, 2004) para sinalizar que “educar é produzir, de maneira intencional, necessidades cada vez mais elevadas nas crianças e nos futuros professores; é lutar contra a alienação empirista e imediatista; é colocar as crianças em contato com o não-cotidiano, por meio da transmissão daquilo que de mais elevado tenha sido produzido pelo gênero no campo da cultura intelectual”. Assim, compreendemos o trabalho educativo como o ato de produzir direta e intencionalmente nos indivíduos aquilo que foi produzido histórica e coletivamente pelo conjunto dos homens. Nesse processo, o ser humano para formar-se enquanto sujeito transformador da realidade social da qual ele é parte, precisa relacionar-se com essa realidade pela mediação da apropriação do conhecimento produzido histórica e socialmente. Com base neste autor, defendemos também uma abordagem de educação que supere os limites do iluminismo sem negar o caráter emancipatório do conhecimento e da razão.
Temos nos dedicado a sistematizar a contribuição das definições sobre trabalho educativo, mediação qualificada do professor, apropriação, produção e transmissão do conhecimento histórico e científico pelo professor, para compreender os processos de formação e desenvolvimento da personalidade na infância, as relações entre o desenvolvimento do pequeno sujeito - criança e das atividades pedagógicas que participam em creches e pré-escolas. Por fim, nossa expectativa é analisar criticamente as indicações sobre as formas mais adequadas de garantir a apropriação da cultura e a apropriação das máximas qualidades humanas nas crianças. Para nós o processo de apropriação da cultura e do conhecimento acumulado historicamente pelos indivíduos é um processo de educação, que é transmitido, oferecido, proporcionado e intencionalizado pelo professor. Portanto, as relações sociais e educacionais sistematizadas pelo professor são de extrema importância para o desenvolvimento das próprias relações sociais que são travadas entre as crianças. Dentro deste contexto, as produções que se dão entre as crianças, não podem ser encaradas apenas no patamar da autonomia e da espontaneidade, pois a interferência e a opção do/a professor/a, torna-se algo necessário.
Duarte (1996) suscita pensar que o professor deve resistir à tendência de tornar fácil a tarefa de formar-se professor, num momento no qual as políticas neoliberais convergem para uma formação aligeirada e totalmente alienada dos processos políticos, econômicos e sociais. Assim, a atividade do professor é um conjunto de ações intencionais, conscientes, dirigidas para um fim específico. Ora, não será possível a criança realizar seu percurso histórico sem a mediação dos adultos, vale dizer da sociedade, da coletividade que lhe é contemporânea.
Podemos deduzir a partir do exposto, que ser professor não é algo tão simples, que ensinar exige preparo, planejamento, um pensar e repensar o fazer educacional-pedagógico. Isto se difere profundamente com o que Faria (2005a) propaga sobre a profissionalização do professor da educação infantil. Para a autora, o importante é valorizar e ser um conhecedor profundo das crianças. Em suas próprias palavras:

[...] o que deve ser destacado no movimento histórico aqui enfocado é a construção de uma pedagogia da educação infantil fundamentalmente não-escolarizante, que incorpora as pesquisas de várias áreas do conhecimento e busca conhecer a criança em ambiente coletivo, na produção das culturas infantis. (Idem, p. 1016).

No que concerne ao papel das relações sociais a autora afirma ainda que:

Desde os anos de 1970, na França e na Itália, têm sido feitas investigações em que, olhando, observando, dando voz e ouvidos à criança – mesmo quando ela ainda não fala, anda ou escreve –, torna-se possível reconhecê-la como capaz de estabelecer múltiplas relações, com um alto e sofisticado grau de comunicação com crianças de mesma ou de idade diferente e com adultos (Idem, p.1016).

Faria (2005) afirma que a perspectiva da criança construtora de cultura surge na década de 1980 com os estudos de Clotilde Rosseti-Ferreira no âmbito da psicologia, precisamente pelo interesse da autora em desenvolver pesquisas na temática das interações entre as crianças . Ela exacerbadamente transfere todo o processo educacional para a valorização das relações que se dão entre as próprias crianças, pois como podemos verificar nas próprias palavras da autora – “as crianças são possuidoras de um alto e sofisticado grau de comunicação (Idem, p. 1016)”. Em seu discurso responsabiliza as próprias crianças por seu desenvolvimento humano. Neste caso, podemos perceber que faz muito tempo que Faria não entre em uma escola de educação infantil, principalmente de uma periferia, do subúrbio ou de uma favela. Falamos isto, pois a cada dia temos que enfrentar com muita perspicácia o que as crianças trazem de seu contexto social e familiar para as escolas infantis. As crianças vêm nos demonstrando que estão diretamente em contato com a violência, a criminalidade, a exclusão social, a fome, a exposição e abuso sexual, as agressões físicas, as injustiças e muitas outras situações. Tudo isto aparece nas relações das crianças, realmente, concordo com a autora, porém, não consideramos que seja um alto grau de sofisticação para o desenvolvimento infantil. Portanto, se o professor não tiver preparo para problematizar tais vivencias, acaba sendo também vítima desta mesma sociedade que é posta às crianças. Neste sentido, que concordo com Duarte (1996), precisamos resistir às concepções tendênciais que tornam fácil a tarefa de ser professor. Neste mundo do capitalismo, torna-se cada vez mais complexa a tarefa de produção e transmissão de conhecimentos, cada vez está mais reduzida a tarefa de desenvolvimento de uma análise crítica. Não negamos as relações que se dão entre as crianças, ao contrário, analisando suas relações sociais, percebemos que elas não podem trazer o elemento novo por si só, não podemos ser coniventes com a defesa de uma educação centrada nas relações das próprias crianças, por este motivo. Concordamos que as crianças rompem, porém não são produtoras autônomas, é preciso que o professor possibilite as referências e por isso ele é o modelo para um desenvolvimento intencionalmente pensado e planejado. Sobre a noção de escola, concordamos com Saviani (1985), quando afirma:

Nela, o professor teria um papel chave na transmissão do saber elaborado, sistematizado, erudito de forma a garantir à população a possibilidade de expressar de maneira elaborada os conteúdos da cultura popular que correspondem a seus interesses (Idem, p. 20).

Assim, sob matrizes diversas, o que parece ser consenso na educação infantil é a valorização das interações entre as crianças, sendo o professor alijado de sua função precípua, qual seja: - pensar, planejar, direcionar, intencionar e sistematizar o desenvolvimento infantil. Este consenso no campo da educação infantil, para nós faz reaparecer o discurso da escola nova, porém travestido como nova roupagem.
Desta forma, afirmamos sem nenhum receio, que o principal motor do desenvolvimento da criança é a relação do adulto-professor com a mesma, sua relação atuará como provocador e não a relação direta de outra criança. O adulto-professor irá buscar subsídios para formar as características humanas nas crianças, as quais são socialmente transmitidas e neste caso, por sujeitos humanos mais experientes e não entre crianças que estão no mesmo patamar de desenvolvimento. Podemos dizer que produzir desenvolvimento é abrir um leque para que as crianças descubram suas potencialidades, já que ninguém se desenvolve diante do que não conhece. A própria concepção de desenvolvimento humano e de professor do discurso hegemônico da área da educação infantil é equivocada. Há uma contradição no discurso da própria produção teórica Em nossa opinião, isto se dá, devido ao ecletismo que paira sobre as produções desta área na contemporaneidade. No texto de Faria (2005b), aqui analisado, podemos localizar esta ambigüidade e contraditoriedade na seguinte passagem:

[...] Também não quer dizer que a educação, nessas instituições não tenha conteúdo, seja espontaneísta, só porque nelas não se trabalha com conteúdos escolares e o professor não ministra as disciplinas escolares formais, o professor é um professor de crianças (Idem, p.1021).

Percebemos que implicitamente a autora aponta para uma concepção de educação nos moldes da teoria histórico-cultural do sujeito humano, revelando um pensamento crítico e aportado no contexto histórico, ou seja, produzindo um discurso contra os modismos educacionais da contemporaneidade. Porém, a mesma se perde quando suas críticas acabam sendo anuladas no conjunto do seu próprio pensamento. Conjunto de pensamentos, que na sua totalidade se entregam aos ideários educacionais que desqualificam a intelectualidade do professor. A armadilha reside no fato de que a autora ao mesmo tempo em que defende um professor para a educação infantil, afirma que o mesmo terá que ser diferente de todos os outros professores, ou seja, que não irá ensinar conteúdos. Muito estranho e inconsistente suas afirmações e definições. Pois, como ser professor, sem ensino, sem processo de aprendizagem?
No traçado do percurso da concepção das relações sociais na educação infantil, Faria (2005a e b) revela que tais concepções estão pautadas fortemente em relações domésticas, na enfermagem e no tradicional, ao invés de estarem voltadas para o que as crianças criam entre elas, o que desejam e o que necessitam. Diante disso, lançamos três críticas à autora:
- Primeira: Não vemos as concepções educacionais tão entregues assim ao modelo tradicional. Também, gostaríamos de saber, o que a autora considera tradicional, já que não explicita em seu texto, apenas indica e descarta da educação infantil. Portanto, perguntamos: - Como romper, avançar e resistir desde jeito tão disfarçado e com críticas tão vazias como as de Faria?
- Segundo: A autora está totalmente centrada no cotidiano em si, no empirismo, no imediatismo, na defesa de uma epistemologia da prática. Seria possível transformar a educação ou ampliar e provocar o universo cultural das crianças, ficando impregnados somente nos seus desejos, necessidades e naquilo que criam?
- Terceiro: Faria indica e nisto concordamos, que as creches e pré-escolas em seu cotidiano estão impregnadas de relações domésticas, fazendo educação como se estivéssemos no âmbito privado, do familiar, porém, no mesmo parágrafo nega o ensino e a aprendizagem. Então, perguntamos novamente: - Como fugir de relações no âmbito do doméstico, do cotidiano, do privado, do familiar, negando o ensino e a escola? Parecê-nos que a autora se envolve em uma armadilha, sendo esta, uma arapuca arma por si mesmo.
É impossível aceitar tais definições, conceitos e concepções para a educação das crianças, sem externar a preocupação com a descaracterização e a desintelectualização do profissional do magistério, precisamos levantar nossas bandeiras em defesa do professor e da educação das crianças!


Considerações Finais: A Mediação como Atividade Central do Professor

Se eu quiser, mesmo agora, depois de tudo passado,
ainda posso me impedir de ter visto. E então nunca saberei da verdade pela qual estou tentando passar de novo – ainda depende de mim! (CLARICE LISPECTOR, 1990)

Nesta parte final do texto, mesmo compreendendo-a em seu caráter insipiente e não-conclusivo das idéias aqui expostas e discutidas, expressamos a importância de retomar alguns pontos da mediação como atividade central do trabalho educativo do professor, visando acrescentar alguns elementos ao debate hoje em curso na área da educação infantil, ou seja, a necessidade de construirmos algumas orientações para a consolidação de uma Pedagogia da Infância, sem com isto, apagarmos ou secundarizarmos o papel intelectual, intencional, sistematizado e de transmissor de conhecimento do professor no processo educativo.
Ainda que consideramos aqui a importância e o significado primordial do papel das relações sociais do professor junto ao grupo de crianças, arriscamos em dizer que as relações entre as crianças em ambientes institucionais constituem uma possibilidade para o adulto (professor) prestar atenção às ações infantis, ao uso que fazem das múltiplas linguagens e aos significados e sentidos que elas lhes atribuem nas suas manifestações culturais. Por sua vez, não há razões para supervalorizarmos essas relações em detrimento do papel e atuação do professor e dos conteúdos escolares. É preciso pontuar os limites e conter algumas expectativas dessas relações sociais nos processos do próprio desenvolvimento infantil. Em nossa compreensão, as relações criança-criança são uma alternativa para podermos conhecer as crianças melhor, intervir adequada e oportunamente, criando estratégias ou formas de participação e negociação mais ativas e partilhadas nos contextos coletivos de educação e não substituir a intervenção direta e intencional de um adulto na transmissão do significado dos conteúdos escolares e da lógica da produção de conhecimentos.
Como procuramos evidenciar aqui, a presença atuante dos professores nos processos de socialização em que as crianças estão envolvidas na instituição escolar, é de suma importância, sendo referência para o desenvolvimento da personalidade e para o desenvolvimento de faculdades e aptidões psíquicas fundamentais, que são requisitos para a constituição do indivíduo como ser humano. Tal evidência nos fez ressaltar o valor do adulto-professor como mediador das relações das crianças entre si, como componente fundamental do processo educativo e também como grande possibilitador de experiências de contato com as variações da cultura humana. O adulto-professor, ante as necessidades, interesses, desejos, vontades, relações, múltiplas linguagens das crianças, passa a ser o responsável pela ampliação dessas experiências e pelo acesso desses atores sociais ao conhecimento que é produzido e acumulado historicamente pela humanidade. Não nos parece ser possível pensar a condição de emancipação das crianças, descentralizando as ações dos adultos ou colocando-os em segundo plano, pois, para que a criança assuma seu papel de ator na sociedade e viva sua condição de cidadã, precisará do apoio, incentivo, instrumentalização e intervenção efetiva e qualificada do adulto-professor. Todavia, por outro lado, é preciso problematizar, romper com as práticas autoritárias, de regulação e controle que caracterizam, em muitas situações, as relações entre adultos e crianças. Isto deve contribuir para tornar a instituição escolar um local prazeroso para aprender e se desenvolver e não transpor os processos de ensino e aprendizagem para a responsabilidade das crianças, deixando-as responsável pelo seu próprio desenvolvimento. Ora, não é possível gerar laços, parcerias e trocas com as crianças, quando elas são deixadas a si próprias ou quando são colocadas sob tutela dos adultos, sem chances de elas interferirem na realidade.
Indicamos que é preciso criar novos possíveis, alargando o espaço da possibilidade, desconstruindo conceitos conformadores de infâncias e crianças como seres de outra espécie, como entidades isoladas do mundo material, físico, afetivo, histórico, cultural e social dos adultos, como se fossem adultos em miniatura ou sujeitos inacabados da condição humana. Pode-se dizer, que as relações sociais passam a configurar como sinônimo de educação, não as conduzindo somente ao pilar criança-criança.
Assim como não se quer negar a condição das crianças poderem ser crianças, também não pretendemos negar a condição dos adultos na creche, como responsáveis pela educação e o desenvolvimento das mesmas:
1) Pela tarefa de conduzir o processo educativo;
2) Organizar as práticas pedagógicas que, no nosso entender, devem apontar na direção da ampliação da experiência e dos conhecimentos das crianças em todas as dimensões humanas;
3) Desenvolver as máximas qualidades humanas, já que consideramos um direito social de todos.
4) Assumir a posição que adultos e crianças estejam no centro do processo educacional, travando relações que valorizem a humanidade que habita em todos nós.
Para não finalizar, passamos a palavra a Osvaldo Montenegro, com um trecho da música “Vale Encantado”, que revela, de forma poética, o universo cultural das crianças. Que ela também possa nos mobilizar a oferecer uma educação que ajude as crianças a acreditar em si mesmas e lutar para viver de forma digna e prazerosa:

Olha o sol tá caindo, como risos em luz prá você.
Viu não é só dor... Viu não é só tristeza não...
Quando anoitece no vale encantado, fica só um
fiozinho de luz vermelha, lá no horizonte. E todas as
crianças do mundo param para ver o pôr do sol.
Ah, o Deus das fadas fica tão triste, se a gente
deixa de ver o pôr do sol.
A linha vermelha puxa uma carruagem cheia de
estrelas, onde está a deusa dos sonhos e seu pó
mágico, que faz a gente pensar coisas lindas!
Quando vocês estiverem tristes pensem em coisas
lindas. Bolas, travessuras, carinho, carrinho, beijo de
mãe, brincadeira de queimada, árvore de Natal,
árvore de jabuticaba, céu amarelo, bolas azuis, risada,
colo de pai, história de avó...
Quando vocês forem grandes e acharem que a
vida não é linda, pensem em coisas lindas mas,
pensem com força, com muita força porque aí o
céu vai ficar cheio de vacas gordas amarelas,
cachorro bonzinho, bruxa simpática, sorvete de
chocolate, caramelos e amigos.
Vamos! Vamos lá! Vamos pensar só em coisas
lindas!
Brincar na chuva, boneca nova, boneca velha,
bola grande, mar verde, submarino amarelo, fruta
molhada, banho de rio, guerra de travesseiros,
boneco de areia, princesas, heróis, cavalos
voadores...
Êh! Já está anoitecendo no Vale Encantado!
Dorme em paz minha criança querida.
Vamos pensar em coisas lindas, até amanhecer.
“Vale Encantado” (Osvaldo Montenegro)


Referências Bibliográficas

ARCE, Alessandra. Pedagogia da Infância ou fetichismo da infância?. IN: DUARTE, Newton (org.) Critica ao fetichismo da individualidade. Campinas, SP: Autores Associados, 2004.

ARCE, Alessandra. A Formação de professores sob a ótica construtivista: primeiras aproximações. IN: DUARTE, Newton (org.) Sobre o construtivismo. Campinas, SP: Autores Associados, 2000.

ARCE, Alessandra. A pedagogia na era das revoluções: uma análise do pensamento de Pestalozzi e Froebel. Campinas, SP: Autores Associados, 2005.

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 5 de outubro de 1988. Organização do texto: Valmir Ascheroff de Siqueira, et al. Rio de Janeiro: Esplanada, 1997. 240p.

CARVALHO, Ana Maria A. e BERALDO, Katharina E. Integração criança-criança: ressurgimento de uma área de pesquisa e suas perspectivas. Cadernos de Pesquisa. São Paulo, n.71, p.55-61, nov. 1985.

DUARTE, Newton. A individualidade para-si: contribuições a uma teoria histórico-social da formação do individuo. Campinas: Autores Asociados, 2000.

DUARTE, Newton (Org.) Critica ao fetichismo da individualidade. Campinas, SP: Autores Associados, 2004.

DUARTE, Newton. Educação escolar, teoria do cotidiano e a escola de Vigotsky. Campinas/SP: Autores Asociados, 1996.

DELGADO, Ana C. & MULLER, Fernanda. Sociologia da Infância: pesquisas com crianças. IN: Educação & Sociedade: Revista de Ciência da Educação. Vol. 26, mai/agos. São Paulo: Cortez, 2005.

FARIA, Ana Lucia Goulart, MELLO, Suely Amaral (Orgs.) Linguagens Infantis: outras formas de lectura. Campinas, São Paulo: Autores Associados, 2005.

FARIA, Ana Lúcia Goulart de e PALHARES, Marina Silveira (Orgs.) Educação infantil pós-LDB: rumos e desafios. 3.ed. Campinas, São Paulo: Autores Associados, 2001, p.67-97.

MARTINS FILHO, Altino José (Org.). Criança pede respeito: temas em educação infantil. Porto Alegre: Mediação, 2005, 160p.

MARTINS FILHO, Altino José et al. Infância plural: crianças do nosso tempo. Porto Alegre: Mediação, 2006, 120p.

MARTINS FILHO, Altino José. Crianças e adultos na creche: marcas de uma relação. Florianópolis, Dissertação 2005. 185p. (Mestrado em Educação) Curso de Pós-Graduação em Educação, Universidade Federal de Santa Catarina.

_______. Crianças e Adultos nas malhas das relações sociais: um estudo sobre os processos de socialização no interior da creche. In: 28a Reunião Anual da ANPED. Caxambu/MG: 2004. Texto disponível em: www.anped.org.br

ROSSLER, João H.. Sedução e modismo na educação: processos de alienação na difusão do ideário construtivista. 2006. Tese (Doutorado em Educação Escolar) – Programa de Pós-Graduação em Educação Escolar da UNESP, Araraquara, SP.

SAVIANI, D. A Nova Lei da Educação: LDB trajetória limites e perspectivas. Campinas, SP: Autores Associados, 1985, 3.ª Edição.

STEMMER, Márcia Regina Goulart da Silva. Educação infantil e pós-modernismo: a abordagem Reggio Emilia. 2006. Tese (Doutora em Educação) – Program de Pós-Graduação em Educação da UFSC, Florianópolis, SC.

Crianças e adultos: duas lógicas socializadoras

Crianças e adultos: duas lógicas socializadoras
Altino José Martins Filho*
* Mestre em Educação e Infância pelo programa de Pós-Graduação da Universidade Federal de Santa Catarina/UFSC. Membro do Grupo de Estudos e Pesquisas sobre Infância, Educação e Escola/GEPIEE/UFSC. Pesquisador líder do Grupo de Estudos em Educação Infantil GEDIN/UDESC.
E-mail: altinojm@ig.com.br
Em uma experiência educacional verdadeiramente compartilhada, as escolhas e decisões precisam ser feitas com o maior consenso possível e com um profundo respeito por uma pluralidade de idéias e perspectivas (SPAGGIARI, 1998).
Infâncias... Crianças e educação. Manifestações traçadas por processos de socialização marcados pela produção e reprodução interpretativa da cultura. Cultura do humano. Cultura das crianças. A vida ganhando expressão nos diversos momentos do cotidiano. Vidas constituídas e constituidoras de experiências estabelecidas em contextos coletivos de educação infantil, sejam creches, sejam pré-escolas. Contextos que recebem crianças e adultos com suas lógicas de socialização. Socialização que sofre confrontos e resistências, mas, também, encontros e reencontros...
Neste artigo, serão apresentadas duas lógicas de socialização, em um ambiente específico de educação formal. Propõe-se discutir e evidenciar a existência de tensões, contradições, resistências, encontros e reencontros nas relações entre adultos e crianças e entre as próprias crianças. Tentamos focar essas relações para perceber, nas crianças, os seus estilos de vida, suas regras e estratégias, seus referentes simbólicos e modos de apreensão do mundo e, assim, compreender a complexidade da infância em suas características intrínsecas e peculiares. Em relação aos adultos, vimos que suas relações foram se evidenciando e se destacando como algo a ser apreendido e analisado, pois suas interferências influenciavam muito as próprias relações entre as crianças. Com base no material empírico coletado na pesquisa (- refiro-me a pesquisa de mestrado em educação e infância no programa de pós-graduação da Universidade Federal de Santa Catarina concluída no ano de 2005-) foi possível perceber que a produção das culturas das crianças está associada ao universo cultural mais amplo, dos condicionamentos e das “múltiplas determinações”. São assim, expressões de uma totalidade maior.
Dessa forma, faz-se necessário antecipar que as relações sociais engendradas no interior de uma instituição educacional são tecidas por muitos relacionamentos e diferentes matizes intrapessoais e interpessoais. Isto se dá em razão de os atores sociais estarem envolvidos por diversas teias, construídas no entrelaçamento de condicionantes sociais, culturais e econômicos, mas que acabam tomando expressões peculiares pela interferência da história e das individualidades dos atores nas relações sociais.
Universos sociais diferentes
São abundantes os trabalhos na área da educação infantil que fazem referência às produções das culturas infantis. Tais abordagens são compostas por um conjunto de práticas e preceitos pedagógicos que vêm seduzindo uma gama bastante grande de professores e pesquisadores. Todavia, notamos que, algumas vezes, a função pedagógica do professor é substituída pela supervalorização das produções culturais das crianças, quase como se estas tivessem poderes mágicos para serem agentes das próprias vidas. Há, sem dúvida, tendências pedagógicas que procuram centrar as propostas educativas nas manifestações das próprias crianças, propagando idéias que a dimensão imaginativa, a produção cultural infantil e o desenvolvimento das crianças constituem-se independentemente de um ambiente produtivo de interações.
Nossa abordagem se diferencia de tal perspectiva, pois se considera primordial a presença ativa dos adultos/professores no processo de produção e reprodução interpretativa (CORSARO, 1997; 2002) das culturas infantis. A partir do que foi observado na pesquisa de campo, não é possível secundarizar e nem desprestigiar a atuação e o papel dos adultos no processo educacional. Vejamos no excerto que se segue:
Felipe está postado no canto do espelho. Matheus se aproxima e pergunta por que ele está sem camisa. Felipe responde que vai para uma festa. O adulto C, que está ao seu lado, questiona: Felipe, você vai para uma festa; posso ir junto? O menino responde que primeiro é preciso se “arrumar toda” para ficar bem bonita. O adulto C fala: como que eu vou me arrumar se não posso ir ao cabeleireiro? O menino responde: deixa que eu te arrumo. A (profissional) senta e solta os cabelos. Felipe começa a penteá-los. Aproximam-se Gabriel, Glaúcia, e Matheus e dizem que também querem ajudar a arrumar. Felipe retruca negativamente: só eu que irei arrumar, tá? O adulto C, segurando a mão do menino, fala: Felipe, no salão de beleza existem várias pessoas que trabalham juntas, que são os auxiliares (e continua explicando)... Então vamos deixar os amigos também participarem, né? A Glaúcia pode ser a ajudante, o Matheus o outro cabeleireiro (...). O menino concorda e a (profissional) combina para pegarem pentes, frascos de objetos de beleza, fitas coloridas e começarem a organizar o salão de beleza na sala. Após a arrumação, o que acaba envolvendo outras crianças também, inicia-se a brincadeira que se estende por quase toda a manhã (Diário de Campo).
As crianças, sendo consideradas atores sociais com competência e dinamismo próprio, revelam, em seu convívio diário com seus pares e com os adultos, o que gostam e o que não gostam de fazer nos espaços/tempos da creche. Neste ponto, pode-se afirmar que as expressões infantis assumem dimensões contextuais e não “reduzem a socialização a uma qualquer forma de integração social e cultural unificada, enraizada num condicionamento inconsciente” (DUBAR, 1997, p.79). Sendo assim, a socialização não se limita a um efeito das relações adultos-crianças, mas é também um efeito das relações entre as próprias crianças. Nas relações adulto-criança, ambos são atores atuantes na cena e de uma forma ou de outra, demonstram suas diversas dimensões humanas. Isto nos sugere rever o papel do desenvolvimento do sujeito humano na própria sociedade; sujeitos que estão imersos nas construções culturais, influenciando-as e sendo influenciados por essas construções.
A cena descrita anteriormente mostra que o adulto C (nome dado à professora pesquisada) buscava uma linguagem comum às crianças, o que possibilitava estabelecer laços de confiança, diálogo e aliança entre esses dois atores sociais. Por parte das crianças, era possível perceber que essa dimensão da socialização favorecia a produção das culturas infantis, pois, quanto mais próximo o adulto revela estar das crianças, mais condições tem de ampliar e oferecer uma gama de materiais para a realização de suas manifestações e processos de criação.
No caso do adulto pesquisado, verificou-se que ele comumente se introduzia nas atividades, brincadeiras e processos de socialização, intervindo junto às meninas e meninos. Esse profissional percebia que os elementos das produções culturais das crianças apresentam-se por meio da ação contextualizada, e tal ação precisa, em muitos casos, ser sistematizada e intencionalizada pelos adultos. As ações de mediação e interação revelam, a um só tempo, que a criança é um ser humano em desenvolvimento e que a condição para a autonomia passa pela mediação do adulto.
Cabe enfatizar que, ao caracterizar as relações desse profissional como favoráveis à produção das culturas infantis, admitimos que, para as crianças, a presença do adulto é de fundamental importância, principalmente se este procura potencializar e mediar de forma qualificada as manifestações culturais das crianças, como algo a ser considerado e ampliado. Na compreensão de Malaguzzi (1999), “para que os processos de socialização possam motivar a aprendizagem e a autonomia intelectual infantil, deve ser criada uma ampla rede de intercâmbios recíprocos entre criança/criança e adulto/criança”.
Nessa perspectiva, cremos que os processos de socialização estabelecidos pelos adultos, quando se pretende uma Pedagogia das Relações, são decisivos e essenciais: como facilitadores das trocas sociais entre os atores; como criativos, ao compor os espaços e ao propor as atividades; como sensíveis, ao acolher os pedidos e ao elaborá-los; e como respeitadores de preferências individuais, ao ouvir e acolher cada sujeito com suas particularidades.
Nesse episódio de socialização, constatamos que, quando o adulto C conseguia ativar a autonomia do grupo de crianças, criava oportunidades para conhecer cada uma delas, com respeito à individualidade, à condição social, cultural, étnica e econômica de cada menino e menina. Sendo assim, faz sentido dizer que “autonomia envolve formar pessoas que saibam trilhar os seus próprios caminhos, traçar a sua história, tomar decisões, construir a autoria e a liberdade. Dessa forma, educar para a autonomia implica possibilitar ao educando a construção das suas regras de conduta, visando à responsabilidade individual e coletiva que permite a convivência humana” (TRISTÃO, 2005, p.137).
Neste caso, pode-se afirmar que a participação do adulto tornava-se indispensável nas interações entre as crianças. Isso lhe possibilitava conhecê-las melhor e vice-versa. Cabe ressaltar que seu envolvimento era algo irradiador da possibilidade de construção de um trabalho pedagógico mais próximo das crianças e, mais distante das técnicas, modelos ou cartilhas que apresentam um discurso monológico, isto é, o adulto falando para as crianças, e não com as crianças. Via-se a dialogicidade como essência da educação. Concordando com Saviani (1994), o profissional da educação – o professor – precisa saber quais conteúdos humanizadores deve selecionar para garantir que a criança se aproprie das máximas qualidades humanas, bem como as formas adequadas para garantir esse processo de apropriação.
Resistência e confronto
O adulto B aproxima-se de algumas crianças que estão na mesa e pede para elas não se levantarem, pois irá organizar a sala para a hora do sono. Karyne olha para ele e diz: eu não quero dormir, não estou com sono. Esse adulto, no meio da arrumação da sala, tirando os brinquedos dos lugares e desmontando os cantos, responde para a menina: pois é, querida, aqui na creche todo mundo dorme. Percebo que as crianças começam a levantar-se das mesas e ficam muito agitadas. O adulto B, em tom de voz alterado, fala: olha, vocês precisam colaborar, pois estou limpando a sala para vocês dormirem em um ambiente limpo, tá? O menino Matheus responde: eu não quero dormir, não estou com sono! Vamos fazer diferente hoje! Em seguida, Matheus senta em um canto e começa a chorar, dizendo que não quer dormir. Ele é acalentado por Analu que diz: não precisa chorar; é só você não dormir; fica igual a mim deitado no colchão de olhos abertos até o adulto C chegar (Diário de Campo).
No excerto, Analu revela a criação de uma estratégia que lhe permite ficar acordada na hora do sono coletivo, atribuindo-lhe um outro significado e uma ruptura frente àquele momento da rotina institucional. Tal expressão é partilhada com Matheus, que, ao manifestar sua insatisfação para o adulto B por ter que dormir mesmo não estando com sono, é abordado por Analu no repasse de sua estratégia para driblar a ordem de que todos precisam deitar e ficar em silêncio durante duas horas após o almoço. Vê-se, mais uma vez, que as meninas e os meninos socializam suas descobertas e trocam estratégias de resistência e confrontação entre as lógicas de socialização.
Assim, como Analu, que apresenta uma estratégia de resistência para o inconformismo de Matheus, muitas crianças ficavam durante a “hora do sono” se remexendo de um lado para o outro sem conseguir dormir. Olhavam para o teto, comunicavam-se por meio de gestos e olhares, ficavam “escavacando” os colchões ou disfarçando; tocavam com o pé o colega do lado ou, ainda, escondiam livros e brinquedos embaixo da almofada e do colchão para poder brincar enquanto os adultos não viam.
Frente às expressões das crianças, verificou-se que o adulto B, envolvido nas atividades de arrumação do espaço da sala, não estabeleceu um diálogo mais profícuo com as crianças Ele até responde aos questionamentos delas, porém, de maneira determinada, esclarece que as coisas já estão definidas e não podem ser mudadas ou pensadas sob outras lógicas. No dia-a-dia da creche, percebi que, para alguns adultos, era impossível ousar fazer a rotina diferente Os relacionamentos referentes ao cuidado com a higiene, sono, alimentação são muitas vezes automatizados pelos adultos, não se dando a devida atenção às necessidades de cada criança, como ser único. Portanto, a instrumentalização de tais momentos significa tornar o sujeito mais adaptável à sociedade, desconsiderando a multiplicidade concreta da experiência infantil. Sendo assim, “o potencial de segregação e de autoritarismo presente nas relações pedagógicas não permite à criança construir o seu próprio universo, desrespeitando, inclusive, a complexidade que tal construção exige” (QUINTEIRO, 2002, p.37).
Nesse sentido, enfrentar a questão das tensões e contradições presentes nas relações entre adultos e crianças é fundamental para avançar em direção a uma concepção de socialização que integre esses dois atores sociais na creche, a tal ponto que as manifestações das crianças não sejam despercebidas e reduzidas. Ou ainda, como define Plaisance (2004), que não sejam levadas a processos de socialização invisível. O contrário disso seria enaltecer as relações das crianças em detrimento do valor do adulto no seu processo de formação humana.
Diante disso, propomos alguns questionamentos: seria tão difícil mudar o momento do sono, levando em consideração as reivindicações das crianças? O que as crianças poderiam fazer em vez de serem silenciadas durante as duas horas de descanso e sono obrigatórios? Que possibilidades de mudanças para a “hora do sono” as crianças apresentariam se lhes fosse oportunizado expor seus pensamentos? O que o menino Matheus queria dizer ao dizer vamos fazer diferente hoje? Que outras relações os adultos poderiam proporcionar às crianças, em vez de estabelecer uma certa rigidez para que todas durmam ao mesmo tempo?
Neste caso, é importante indagar: o que faz os adultos não viverem mais as múltiplas linguagens com que foram presenteados na infância? Por que será que elas ficam esquecidas/adormecidas, se proporcionam às crianças tanta felicidade, movimento, expressão, liberdade, fantasia, imaginação... Será possível algum dia ver os adultos buscarem nas crianças subsídios para viverem de forma plena a vida ou, ainda, será que algum dia olharão para as crianças de maneira a admirar e respeitar seus jeitos de ser, sem espanto, assombro, mas com satisfação e contentamento pela forma como vivem essa fase da vida? Como se desvincular do autoritarismo, da prepotência e do atraso de uma educação castradora do prazer? Parece que o caminho é pensar em uma educação que procure outras trilhas, no intuito de construir e viver a liberdade, a democracia e a autonomia, instituídas no paradigma do prazer, da espontaneidade, da diferença, da diversidade e da criatividade. Quem sabe este é o segredo para superar as turbulências que o mundo nos apresenta!
Constatamos que o processo de socialização, para alguns profissionais, assume a forma de uma relação pedagógica que submete a conduta das crianças às normas preestabelecidas. Essas normas servem como instrumento de alienação dos sujeitos, negando e substituindo, de forma autoritária e arbitrária, a construção de significados e de conceitos elaborados pelas próprias crianças. Assim, percebeu-se que o olhar das crianças permite revelar fenômenos sociais e culturais que o olhar dos adultos deixa ocultar.
Neste caso, verificamos que os adultos, ao exigirem das crianças o “bom comportamento” (ou seja, agir respeitando as normas disciplinares da instituição), acabavam impondo sobre elas um controle excessivo. Este fato os levava a manipular aspectos da própria cultura infantil para submeter as crianças a padrões sociais em prol de uma “boa educação”, que, como já mencionado, geralmente estavam ligados à adaptação e à conformação às regras e estratégias definidas pelos próprios adultos. Assim, exercer a coerção não significava uma autoridade explícita, pois alguns adultos, em muitos momentos, recorriam ao imaginário infantil. Reconhecemos que há que ter uma certa disciplina em um grupo com crianças pequenas, mas também percebemos que a criança deve ter garantido seu espaço/tempo de manifestação, participação, expressão, comunicação e produção cultural, que lhe permita viver sua infância na plenitude de sua geração.
De fato, pode-se perceber que as crianças expunham com intensidade seus desejos, anseios e necessidades, extrapolando os limites impostos e estabelecendo estratégias de rompimento frente ao que era colocado de forma arbitrária, em situações opostas ao mundo infantil. Dessa forma, para além da dimensão da brincadeira, foi possível apreender que as regras e estratégias formuladas pelas crianças possuíam uma forma específica de explorar o ambiente, de se relacionar com seus pares e com os adultos, que extrapolam os processos de socialização. Isto lhes garantia a possibilidade de expressar e criar suas culturas infantis.
Outras proposições
Assim, ao defender que as instituições de educação infantil são espaços de produção cultural das crianças, não podemos cair em uma fetichização da infância, o que nos levaria à total rendição à individualidade alienada desde a mais tenra idade (DUARTE, 2004, p.229). Isso quer dizer que o desenvolvimento cultural da criança, mais do que sua inserção na cultura, é inserção da cultura nela, para torná-la um ser cultural, considerando que as formas de interação entre crianças e cultura são mediadas pelas produções culturais (MARTINS FILHO, 2006).
Concordar com propostas que consideram as crianças produtoras de culturas, sujeitos ativos nos processos sociais, co-construtoras de conhecimentos, de identidades que as convertem em seres humanos, é diferente de considerá-las atores do próprio destino, supervalorizá-las em si mesmas. Não é possível aceitar que as crianças sejam confinadas em um isolamento do universo cultural mais amplo. Todavia, extrapolar as concepções que abreviam e dicotomizam a produção cultural das crianças é explicitar a importância de considerar as crianças parte integrante de uma classe social e cultural, orientando a organização de práticas voltadas para o máximo desenvolvimento humano na infância. Nas palavras de Arce (2001, p.164), é ir contra a inserção da criança na vida social, como um processo natural, universal e imutável, não deixando aparecer seu caráter histórico.
Dessa forma, consideramos que as crianças e os adultos devem ser vistos como uma multiplicidade de seres em formação, incompletos e dependentes, e é necessário superar o mito da pessoa autônoma e independente, como se fosse possível não pertencermos a uma complexa teia de interdependências (DELGADO e MÜLLER, 2005). Em relação às crianças, não abrimos mão do fato de que são seres em formação e que, por isso, necessitam do cuidado, proteção, atenção, de uma ação educacional e cultural dos adultos frente aos desafios que o mundo lhes apresenta. A partir de uma abordagem histórica, defendemos que o ser humano se constitui como síntese de múltiplas determinações, estando seu desenvolvimento e sua própria humanidade interligados a um conjunto de relações sociais.
Neste caso, valorizar e se ater à prática cultural das crianças em sua singularidade não significa desvinculá-la das determinações sociais mais amplas, mas sim a possibilidade de poder entender essa especificidade – essa produção cultural – que, para nós, é expressão de uma totalidade maior. Assim, o fato de buscar superar as concepções que centram o foco somente no ensino e no professor não pode nos levar a uma negação da presença do professor e do processo de ensino-aprendizagem que deve ser intencionalizado e mediado por ele. Como afirma Duarte (2001), não existe uma essência humana independente da atividade histórica dos seres humanos, da mesma forma que a humanidade não está imediatamente dada nos indivíduos singulares.
Ao trazer as produções das culturas infantis, pretendemos romper com uma educação marcada por abordagens escolares apoiadas em didáticas e técnicas pedagógicas que instrumentalizam a educação das crianças para uma formação humana calcada no viés da submissão e subordinação, alienando-a. Assim, temos um grande desafio, que é não subestimar as crianças, considerando-as incapazes, nem superestimá-las, atribuindo-lhes comportamentos muito além de suas capacidades e condições emocionais. Temos que ter cuidado para não cair num desamparo, abandono, nem exigir um comportamento de quem ainda não o tem para oferecer, pois, dessa forma, estaríamos negando a proteção da criança perante um mundo exigente e difícil.
Referências
Sugestões de leitura
ARCE, A. Compre um neoliberal para a educação infantil e ganhe grátis os dez passos para se tornar um professor reflexivo. Educação &Sociedade, Campinas, ano XXII, n.74, p.251-283, abr. 2001.
CORSARO, William A.. The sociology of childhood. Thousand Oaks: Pine Forge Press, 1997.
CORSARO, William. A reprodução interpretativa no brincar ao “faz-de-conta” das Crianças. Educação, Sociedade e Culturas. Edições Afrontamento, LTDA: Porto, Portugal, nº 17. p. 113-134, 2002.
DUBAR, Claude. A socialização: a construção das identidades sociais e profissionais. Porto: Editora, Coleção Ciências da Educação, 1997.
DUARTE, Newton (Org.) Critica ao fetichismo da individualidade. Campinas, SP: Autores Associados, 2004.

DELGADO, Ana C. & MULLER, Fernanda. Sociologia da Infância: pesquisas com crianças. IN: Educação & Sociedade: Revista de Ciência da Educação. Vol. 26, mai/agos. São Paulo: Cortez, 2005.
MALAGUZZI, Loris. História, idéias e filosofia básica. In: EDWARDS, Carolyn; GANDINI, Lella & FORMAN, George. As cem linguagens da criança: a abordagem de Reggio Emilia na educação da primeira infância. Porto Alegre: ArtMed, 1999. p.59-104
MARTINS FILHO, Altino José (Org.). Criança pede respeito: temas em educação infantil. Porto Alegre: Mediação, 2005, 160p.
MARTINS FILHO, Altino José et al. Infância Plural: crianças do nosso tempo. Porto Alegre: Mediação, 2006, 120p.
MARTINS FILHO, Altino José. Crianças e adultos na creche: marcas de uma relação. Florianópolis, Dissertação 2005. 185p. (Mestrado em Educação) Curso de Pós-Graduação em Educação, Universidade Federal de Santa Catarina.
MARTINS FILHO, Altino José. A vez e a voz das crianças: uma reflexão sobre as produções culturais na infância. In: Presença Pedagógica. Belo Horizonte/MG. n.61, p.35-45, jan./fev.2005.
MARTINS FILHO, Altino José. O lugar da criança. Pátio Educação Infantil, ano 6, nº. 17, p. 10-13, jul/out 2008.
PLAISANCE, Eric. Para uma sociologia da pequena infância. In: Cedes, São Paulo, n.86, v.25, p.220-241, 2004.
QUINTEIRO, Jucirema. Infância e educação no Brasil: um campo de estudo em construção. In: FARIAS, A. L. G. de et al. (orgs.). Por uma cultura da infância: metodologias de pesquisa com crianças. São Paulo: Autores Associados, 2002, p.19-47.
SAVIANI, Dermeval. Escola e democracia. São Paulo: Cortez, Autores Associados, 1994.
SPAGGIARI, Sergio. Considerações Críticas e Experiências de Gestão Social. In: BONDIOLI, Anna & MANTOVANI, Susanna. Manual de Educação Infantil: de 0 a 3 anos –uma abordagem reflexiva. 9. ed. Porto Alegre: ArtMed, 1998. p. 96-113.
TRISTÂO, Fernanda Carolina Dias. A sutil complexidade das práticas pedagógicas com bebês. In: MARTINS FILHO, Altino José (et al.). Infância plural: crianças do nosso tempo. Porto Alegre: Mediação, 2005. p.39-56.

FORMAÇÃO DE PROFESSORES: QUESTÕES PARA UMA REFLEXÃO À LUZ DA TEORIA HISTÓRICO-SOCIAL

FORMAÇÃO DE PROFESSORES: QUESTÕES PARA UMA REFLEXÃO À LUZ DA TEORIA HISTÓRICO-SOCIAL


MARTINS FILHO, Altino José/UFSC – altinojm@ig.com.br
MARTINS FILHO, Lourival José/UDESC – f2lourival@udesc.br

EIXO: Formação de Professores/n.10

Agência Financiadora: Sem Financiamento


1 – Do ponto de partida às primeiras questões sobre a Formação de Professores

Neste trabalho pretendemos apontar alguns aspectos acerca do debate teórico sobre concepções educacionais e filosóficas de formação de professores. O estudo vincula-se à produção de conhecimentos no campo da Educação Infantil. O tema que trazemos aborda de maneira preliminar parte dos resultados de uma pesquisa de natureza crítico-analítica (DUARTE, 2005) que está sendo desenvolvida em uma universidade publica da Região Sul do Brasil. A referida pesquisa discute a produção de conhecimentos sobre a formação de professores e o trabalho docente na educação infantil, seguindo o objetivo de oferecer um panorama sobre a condição da produção. Neste artigo especificamente estaremos problematizando teorias e tendências para a formação de professores que vêm se revelando contemporaneamente como modelo de formação a ser seguido e referenciado como novidade educacional. Trata-se, com isto, apontar elementos da teoria histórico-social que a pesquisa vem demonstrando imprescindível para o aprofundamento do quadro teórico-metodológico na produção de conhecimentos para a formação de professores.
Com base em Duarte (2001) apresentamos a premissa que advoga a necessidade da constituição de um campo de estudos e pesquisas que denominamos de teoria histórico-social da formação do indivíduo, que sintetize os múltiplos aspectos desse processo de formação, incorporando as contribuições das várias ciências humanas. Para o autor essa incorporação, entretanto, tem como primeiro momento, a análise crítica das concepções de homem e de indivíduo que fundamentam as várias correntes existentes em cada uma das ciências humanas. Nesse contexto que adotamos a perspectiva histórico-social como opção teórica e metodológica deste trabalho.
A partir da consideração de Duarte (2001), tomamos como desafio caracterizar de maneira crítica algumas concepções sobre a formação de professores, principalmente as que têm sido consideradas e divulgadas por muitos organismos internacionais, pela mídia, pelas políticas publicas e por alguns setores significativos da academia. Concepções que sob enfoques diversos vêm propagando formar o professor-reflexivo, o professor-prático-reflexivo e o professor-pesquisador (ARCE, 2001; DUARTE, 2001, 2005; MORAES, 2004). Tais concepções que estão sendo difundidas principalmente no Brasil a partir do final do século XX e início do século XXI, em nossa reflexão, estão calcadas pelo viés da “epistemologia da prática”. Moraes (2004, p.153) formula a tese de que são propostas de formação de professores que advogam sua competência para responder às questões – e apenas essas – de suas tarefas cotidianas. Para esses profissionais uma formação aligeirada basta. A análise apresentada por nós compartilha da mesma tese.
Segundo Arce (2001), a perspectiva que defende uma formação na linha da “epistemologia da prática” os cursos de formação de professores não devem ficar “gastando tempo” inculcando conteúdos. Em tal abordagem, mais importante é o professor entender como o aluno conhece, por isso o destaque aos estudos do cotidiano em-si, compreendido como fontes da formação dos professores. Neste caso, o “professor-reflexivo, o professor-pesquisador e o professor-prático-reflexivo constituem qualidades fundamentais ao professor para solucionar os problemas cotidianos e também para desenvolver nos alunos essas mesmas habilidades”. As necessidades práticas e interesses do professor devem estar em primeiro plano.
Nesse sentido, questionamos o pretenso caráter utilitarista e pragmático das proposições difundidas contemporaneamente para a formação de professores. Concordando com Arce (2001) e Duarte (2001, 2005), avaliamos que tais proposições significam mais um retrocesso do que um avanço para os cursos de formação de professores, pois de maneira exacerbada conduzem à negação da importância da apropriação do conhecimento por parte do professor em seu processo formativo, contribuindo assim para a desqualificação, desintelectualização e desprofissionalização do professor. Arce (2001, p.59) se posiciona sobre deveria ser a formação do professor, destacando que:

A formação do professor precisa contemplar as diversas áreas de conhecimento humano para que sua cultura seja vasta. Fornecendo-lhe assim elementos para que possa ensinar os alunos, possibilitando-lhes enxergar a humanidade, seus anseios e necessidades e não somente os seus próprios interesses imediatos. O conhecimento deve inquietar, ser uma vacina contra a apatia e o egoísmo. Ainda não possuímos melhor forma de fazer isso do que a leitura e o ensino. Eis o que a educação do professor deveria fazer.

Salientamos, portanto, que já existe um número considerável de estudos que procuram caracterizar e denunciar o caráter simplista e que lutam contra a massificação dos cursos de formação de professores. Pesquisadores como – (ARCE, 2001; DUARTE, 2001, 2005; MORAES, 2004; STEMMER, 2006; SAVIANI, 1985,2003; SHIROMA, 2003) – indicam que a supervalorização dispensada à formação do professor por meio de vieses que enaltecem o cotidiano em-si, a prática imediata, a prática reflexiva e espontaneísta fazem acompanhar, contraditoriamente, uma formação fragmentada, emergencial, instrumental, utilitarista e esvaziada de conteúdos teóricos e críticos. Esta formação recorrente das exigências do sistema capitalista e de determinações políticas baseia-se no âmbito da instrumentalização escolar. Isto preocupa, sobretudo pelo fato do empobrecimento que vem causando no campo educacional, com uma visível perca na qualidade do desenvolvimento intelectual do professor e no processo de formação do próprio ser humano de maneira geral.
Observamos que as propostas de formação de professores se esquivam de uma análise da apreensão do real em sua concreticidade. Assiste-se atualmente uma descaracterização do papel do professor em sua complexidade. Este profissional vem sendo alijado de sua função precípua, qual seja – o de transmissor dos conhecimentos produzidos e acumulados ao longo da história da humanidade. Nota-se que esta descaracterização tem provocado a desintelectualização do trabalho docente, fortalecendo uma ontologia velada, estreitamente vinculada a uma prática imediatista e voltada em si mesma. Pode-se, assim considerar, que a formação de professores no momento atual se encontra mergulhada apenas nas manifestações empíricas, que permite apenas uma apreensão superficial da própria prática, não permitindo a este profissional distinguir o essencial do circunstancial, alargando o mundo das aparências e distanciando-se da sua essência.
Essa situação é preocupante e nos interessa porque, a nosso ver, uma formação de professores (seja inicial ou continuada) sólida, consistente, com rigor teórico e de qualidade (tanto teórica como metodológica) pode de alguma forma contribuir para fortalecer uma proposta contra-hegemônica de sociedade, principalmente quando procura interferir positivamente no processo de constituição de humanização do próprio ser humano. Sendo assim, ao problematizar questões relativas sobre a formação de professores devemos considerá-las a partir das transformações sociais em suas múltiplas determinações históricas. Nesse sentido que questionamos: Á quem interessa os cursos de formação de professores atualmente estarem configurados sob o viés da epistemologia da prática e voltados para os problemas do cotidiano em-si? Em que medida os programas de formação de professores que apenas consideram a reflexão sobre a prática imediata podem ser considerados os responsáveis pela restrição do papel do professor como executor de tarefas, esvaziando sua formação de reflexões profundas sobre os processos educativos?
Como assevera Rossler (2006, p.4) é preocupante e inaceitável a maneira como nossos governantes vêm conduzindo as questões relativas à nossa educação. O autor aponta que assistimos de camarote o empobrecimento crescente da cultura, em todos os seus níveis, que por sua vez implica o empobrecimento da formação e do desenvolvimento intelectual, afetivo e moral do ser humano. Desta forma, as tendências contemporâneas de formação para os professores, não poderiam estar muito diferentes deste processo histórico e social contraditório e de completa alienação. Ou melhor, não poderiam encontrar-se isentas dos efeitos devastadores cada vez mais irracional e fetichista da lógica objetiva da sociedade capitalista. Esta situação vem sendo discutida e causando inquietação aos pesquisadores, que sob a perspectiva histórico-social defendem uma formação humana que forneça elementos aos sujeitos para a compreensão mais adequada do real e, em decorrência, criando diversas possibilidades de intervenção na realidade no sentido de sua transformação social.
Neste caso, afirmamos que a formação do professor encontra-se à mercê dos fortes ventos que sopram a ideologia neoliberal e pós-moderna. Perspectivas que vêm descaracterizando o trabalho docente do professor da sua essencialidade; seja no desenvolvimento da formação da individualidade humana, na transmissão dos conhecimentos ou na articulação da cultura universal do gênero humano que vem sendo construída ao longo do processo histórico.
Contra estas tendências pedagógicas e de formação de professores que queremos marcar a importância do acesso e da apropriação da produção de conhecimentos, tanto pelos professores que estão em formação inicial ou continuada ou como atividade central do trabalho docente. Entendemos ser este o mecanismo primordial para que as camadas trabalhadoras da sociedade possam desenvolver reflexões críticas sobre a compreensão da realidade objetiva. Neste quadro, a questão da produção e transmissão de conhecimentos é basilar não apenas na formação de professores, mas na prática cotidiana da sala de aula. Há que se investir em programas de formação de professores que não se entreguem ao “recuo da teoria”, isto é, que supere a supressão das discussões e reflexões de caráter teórico.
Nesse sentido, o texto desenvolve reflexões teóricas introdutórias para um projeto sobre formação de professores considerando a abordagem histórico-social na formação do ser humano em geral.

2 – Questões sobre a Formação de Professores: superando a lógica capitalista e centrando-se na perspectiva histórico-social

Entendemos estar em jogo um dos preceitos fundamentais com a concepção de educação subjacente à lógica do capitalismo, a qual nos impõe uma condição de ação cada vez mais dependente das relações mercadológicas. Tal lógica compreende a educação institucionalizada como um serviço de satisfação ao cliente ou uma mercadoria comercializável, e não como um bem público e direito de todos os seres humanos. Segundo Arce (2001), a inserção da educação no mercado competitivo caracteriza-se pela descentralização, onde a educação deixa de ser um direito para ser tornar mercadoria.
No que se refere a uma análise da relação do desenvolvimento do capitalismo com o desenvolvimento da educação escolar no âmbito brasileiro, Duarte (2001) evidencia em seus vários trabalhos uma tendência essencialmente negativa, o que contribui para a manutenção da hegemonia da concepção liberal-burguesa de homem, de sociedade e de educação (Idem, p.24).
Embora hoje possamos reconhecer a necessidade de se travar uma luta pela superação da sociedade capitalista, parece-nos que cada vez mais, somos levados a acreditar que seja possível realizar tal tarefa por meio da fragmentação da realidade humana. Ou seja, que o cotidiano isolado de sua totalidade é suficiente para subverter, transformar e enxergar a condição de exploração na qual a sociedade se encontra. Desta forma, entendemos que seja necessária uma aproximação com o real em sua totalidade e concreticidade. É neste sentido que a abordagem histórico-social nos ajuda compreender o contexto em que a formação de professores atualmente está calcada, já que em sua perspectiva, para se entender o contexto é necessário buscar compreender o processo histórico que o envolve.
Portanto, falar em transformação da sociedade é falar em organização dos sistemas educacionais, principalmente quando se vive em um país como o Brasil, que se deixa influenciar muito rápido pelas políticas internacionais de exploração e/ou pelos modismos criados no campo da educação. Deste modo, acreditamos que a educação seja um dos canais para a mudança da sociedade, é a via de formar os sujeitos em cidadãos ativos na sociedade, capazes de dar direção à via para além dos estreitos limites do individualismo. Entretanto, como afirma Duarte (1996, p.40-41), não se trata de supor ingenuamente que a educação possa, por si só, superar a alienação produzida pelas relações capitalistas. No caso da Educação de modo geral, o que vemos na realidade, é uma situação digna de sérias preocupações. Principalmente, no que concerne às escolas e salas de aula, onde o reflexo do quadro econômico desumanizante, o descaso dos políticos e a desigualdade social do país são mais devastadores vazio de sentido.
Assim, como vivemos a ascensão do capitalismo nos tempos atuais, podemos concluir que as propostas de políticas para a educação tendem a obedecer uma lógica primeiramente mercantil. Obedecendo esta lógica, a educação é elevada à função de instruir e adaptar, preparando a inteligência para resolver problemas concretos de uma realidade imediata circunscrita às necessidades primárias de sobrevivência. Um exemplo são as políticas educacionais atuais, que em sintonia com as ideologias do capitalismo, têm apontado para um verdadeiro arrevesamento da teoria na formação de professores, contribuindo assim, contudo, para uma visível perda na qualidade da formação teórica e prática dos professores.
Contraponto-se a esta situação, a abordagem histórico-social, sob a perspectiva do materialismo histórico dialético, compreende que a educação escolar pode ser considerada a atividade, por excelência, do processo de constituição de humanização do ser humano. Entretanto, considerando o panorama dos cursos de formação de professores e as políticas educacionais circunscritas ao Ministério da Educação do nosso país, podemos dizer que a apropriação da teoria histórico-social seja um instrumento fundamental para se contrapor as questões que vêm conduzindo a nossa educação, principalmente quando se pretende inserir a educação na luta contra-hegemônica.
Pautando-nos em Cardoso (2004), podemos afirmar que a educação escolar pública desde sua gênese de criação e expansão, serviu aos interesses de uma determinada classe, que na época estava se tornando hegemônica: a classe burguesa. Portanto, a educação publica foi pensada como estratégia para a concretização dos então novos ideais burgueses. A formação de cidadãos e o domínio mais generalizado de saberes eram mesmo uma condição para a consolidação do modo capitalista de produzir e do seu modo de gestão política, a democracia burguesa.
De início, a burguesia travou uma luta revolucionária contra os preceitos da sociedade aristocrática, apregoando novas ideologias contra todo o arcabouço político, econômico, religioso e ideológico daquela sociedade. Assim é que a educação pública requerida para a formação das novas gerações burguesas foi proposta de forma universal a todos os sujeitos da sociedade. Há então um vínculo claro entre educação pública e a construção do Estado nacional burguês, sendo constituído sob a forma de uma democracia burguesa (CARDOSO, 2004). Portanto, a escola pública foi projetada e expandida tendo como referência os princípios da sociedade burguesa, classe social em ascensão no período da expansão do ensino público.
Desta forma, a burguesia sendo atualmente a classe dominante, não necessita mais investir ou proclamar os seus próprios princípios, quais sejam: - igualdade, liberdade e fraternidade (lemas burgueses da revolução) – por conseqüência não necessita mais da escola pública, que, pelo contrário, serve aos filhos das demais classes. Nessa direção, que consideramos o estudo da matriz teórica marxista, como de primordial importância para findarmos uma crítica aos moldes da escola contemporânea. Tal crítica também precisa ir de encontro aos anseios do próprio capitalismo, pois ele apropriou-se da escola, transformando-a em negócio, altamente lucrativo, tanto financeiro quanto ideológico. Frente a isso, concordamos novamente com Cardoso (2004, p.06), quando afirma que, a escola é um aparelho ou um dispositivo social que se estabelece no capitalismo como um dos pilares da reprodução social.
Cardoso (2004, p.6) defende uma educação que abra corações e mentes e que ao mesmo tempo possa desenvolver a sensibilidade, a sutileza, os valores humanos, a consciência crítica e a própria humanidade em cada sujeito. Percebemos que não desvaloriza a figura do professor e/ou do processo educativo que envolve o ensino e a aprendizagem, ao contrário, luta contra o empobrecimento ou mesmo o esvaziamento dos sentidos mais próprios e amplos do conhecimento. Assim, defende que o homem deveria poder ser dotado de múltiplas aptidões, tanto manuais quanto intelectuais e este deveria ser o objetivo das práticas educativas. Nessa linha de raciocínio, recorremos a Marx (2002), que concebe o “homem na sua totalidade” como um ser ontologicamente social, no intuito de almejar uma possibilidade de uma sociedade futura, pensada em contraposição à sociedade constituída sobre a divisão do trabalho (sociedade de classes) e aos efeitos mutilantes do decorrente parcelamento das tarefas.
Os processos educativos, assim como a formação docente, nesta perspectiva carregam consigo a função de desenvolver no sujeito a criticidade, a complexidade do mundo objetivo, a pluralidade social e de classe, a complexificação do conhecimento historicamente acumulado, para a partir daí, tentar romper com a massificação conformista, reducionista e simplificadora da educação escolar, a qual retira do professor a condição de intelectual e transforma o ensino em atividade meramente instrumental, com conteúdo de caráter utilitário e pragmático.
Urge, então, reafirmar o que Cardoso (2004) nos adverte: a perspectiva de transformação social nas sociedades contemporâneas exige a crítica. Porém somente a crítica não basta. A critica transformadora é a critica combatente, construída nas lutas concretas pela transformação. Que não permitimos que nos roubem o que pouco nos resta, ou seja, a condição de sujeitos capazes de criticar e lutar por uma transformação social digna para todos.
Trata-se, de defender uma educação escolar que sustente a necessidade de uma educação formadora (de discernimento, de critica e de liberdade), instrutora (de conteúdos, saberes) e estreitamente vinculada à produção de conhecimentos. Parece-nos ser este o reconhecimento da necessidade de uma educação escolar com instrução mais extensa, mais profunda e mais aberta para a formação da razão e o aperfeiçoamento da crítica.
Nesse sentido é que estamos questionando o pretenso caráter empirista das proposições sobre formação profissional na educação básica. O qual vem determinando o empobrecimento dos conteúdos da formação, por meio de sua adaptação pragmática à realidade cultural imediata e alienada dos professores, bem como disseminando pelo discurso e por suas propostas a tendência que secundariza o professor como transmissor de conhecimentos produzidos e acumulados pelas gerações passadas ao longo da história da humanidade, pois este mesmo discurso e estas tendências pedagógicas defendem a centralidade do aluno nos processos de ensino/aprendizagem e a construção autônoma dos conhecimentos (DUARTE, 2001; ARCE, 2000; ROSSLER, 2006). Para Duarte (2001), em casos extremos algumas propostas e tendências pedagógicas em sintonia com o lema “aprender a aprender” rejeitam, inclusive, a própria objetividade do conhecimento, isto é, seu caráter objetivo e transmissível. Frente a isto, concordamos com Duarte (2001, p.620) quando afirma que:

De pouco ou nada servirá mantermos a formação de professores nas universidades se o conteúdo dessa formação for maciçamente reduzido ao exercício de uma reflexão sobre os saberes profissionais, de caráter tácito, pessoal, particularizado, subjetivo, etc.

Em relação a estas questões, as reflexões de Saviani (1999) são essenciais, pois nos suscitam pensar na relação direta entre a lógica da racionalidade financeira e a própria lógica da estrutura da sociedade capitalista, que tem como conseqüência, invariavelmente, a subordinação das políticas sociais à política econômica. E que nas condições atuais faz com que a racionalidade financeira passe a comandar as políticas de modo geral e conseqüentemente, as políticas sociais, dando origem à chamada abordagem “neoliberal das políticas públicas”.
Neste contexto, chamamos a atenção para o fato de que quando procuramos estudar a política educacional de acordo com as categorias próprias do pensamento neoliberal a educação é sempre posta em xeque. Pois os problemas que se identificam como causadores da crise dos sistemas educacionais na atualidade, são considerados elementos integrantes da própria crise que perpassa a forma de regulação assumida pelo Estado neste século que é a orientação para a formação de um Estado-Mínimo, cujas responsabilidades sociais a ele dirigidas ficam cada vez mais restritas. Assim, concebe-se que a política educacional, bem como outras políticas sociais, será bem sucedida, na medida em que tenha por orientação principal os ditames e as leis que regem os mercados, ou seja, a orientação na direção do privado.
Como já salientamos, nossa proposta é indicar vieses que colocam a formação de professores sob a lógica do capitalismo, problematizando concepções e propostas de formação que se fundamentam pela epistemologia da prática. Linha de pesquisa que se deixa seduzir pelo empiricismo mais ingênuo ou pela construção de teorias que se justificam por sua utilidade instrumental. Teorias que sob a perspectiva pragmática defendem que o professor é um agente reflexivo e que sua atuação está pautada no horizonte somente da prática pedagógica. A recusa completa por perspectivas que supervalorizam a prática pedagógica em detrimento da uma formação teórica e crítica se dá pelo fato que quando se reduz o âmbito de exigência de qualificação para ingresso na profissão ou se aligeira a formação (Shiroma, 2003, p.65) a profissão sofre uma violenta desqualificação em todas as suas dimensões. Shiroma (2003) pontua que a preocupação das reformas educacionais a partir da década de 1990, foi a de modelar um novo perfil de professor competente tecnicamente e inofensivo politicamente. A partir dos estudos desta autora podemos afirmar que:

Formar um professor-profissional, nesses moldes, não significa que este viesse a ser mais qualificado, mas apenas mais competente, o que vale dizer “mais adequado”, apto e cooptado. Mesmo que o professor apresentasse maior autonomia de ação, as opções dentro do espaço de trabalho, o aumento da flexibilidade funcional e sua transformação em expert iriam colocá-lo em dificuldade para compreender que as soluções para os problemas não advém apenas da reflexão sobre sua prática, especialmente quando enclausurada no espaço da sala de aula ou limitada pelos muros das escolares. Isto é, a reflexão sobre a prática é necessária, porém insuficiente (Shiroma, 2003, p.76-77).

Nesse sentido, Arce (2000) nos coloca como desafio a necessidade do professor desenvolver um olhar investigativo fundamentado na teoria, no sentido de reorientar o planejamento da instituição. Ser professor nestes termos é ser um intelectual que planeja, repensa e replaneja o seu fazer pedagógico e isso, por sua vez, exige leitura, análise e interpretação.
Essas perspectivas de formação que colocam os professores como sujeitos reflexivos a partir de sua prática pedagógica, para nós estão conciliadas as políticas neoliberais de formação de professores cujo objetivo é a formação técnica, didática e metodologicamente preparada para a aplicação de manuais, sem conhecimento científico e análise crítica por parte dos professores.
Nesta perspectiva, parece-nos claro que a permanência no cotidiano, centrando-se em uma reflexão somente a partir da prática, sem que se tenha um olhar de estranheza e por isso mesmo de distanciamento, serve apenas para tornar essa realidade cada vez mais esvaziada do seu caráter político-social de apropriação do conhecimento e de formação de consciências para a transformação das condições concretas de vida, em especial das condições da prática pedagógica.
Característica esta essencial para o resgate do aspecto de intelectualidade do professor que como expressa Gramsci (apud. Duarte 1996, p. 72).

Deve-se convencer a muita gente que o estudo é também um trabalho e muito fatigante, com um tirocínio particular próprio, não só muscular-nervoso, mas intelectual: é um processo de adaptação, é um hábito adquirido com esforço, aborrecimento e mesmo sofrimento (...) essas questões podem se tornar muito ásperas e será preciso resistir à tendência a tornar fácil o que não pode sê-lo sem ser desnaturado.

De acordo com as palavras de Gramsci o professor deve resistir à tendência de tornar fácil a tarefa de tornar-se professor, num momento no qual as políticas educacionais convergem para a formação aligeirada e totalmente alienada dos processos políticos, econômicos e sociais que colocam em xeque não só a “educação para todos”, como também uma “formação para todos”, na medida em que a garantia da formação será dada àqueles que puderem comprá-la. Desta forma, retira-se o que deveria ser prioridade na formação de professores: a apropriação de conhecimentos. Pensar o processo de formação dos/as professores/as é de primordial importância, principalmente quando se observa o esvaziamento da teoria neste processo, o qual se revela mergulhado em uma perspectiva que aponta para uma epistemologia da prática, entregando-se muito facilmente a lógica do capitalismo.

3 – Questões sobre a Formação de Professores no campo da educação infantil: sínteses finais – porém – provisórias para este trabalho


Tendo em vista as questões dispostas neste trabalho, como possibilidades de debate e reflexão sobre a formação de professores, precisamos insistir na estratégia a qual Saviani (1999) chama de “resistência ativa” na qual propõe aguçar a nossa consciência sobre a necessidade de se assumir uma postura mais ativa, participativa e transformadora do estado de coisas vigente. Com isto, não propomos uma revolução, até porque não será possível tal intento sem um engajamento de toda a sociedade; mas, acreditamos, contudo, na superação (via resistência) dessa formação que estamos considerando fragmentada e técnica. Buscando para tanto a garantia da formação enquanto um direito dos profissionais da educação, em geral, e, especificamente, dos profissionais da educação infantil.
Tratando-se especificamente do campo da educação infantil, isto parece ser essencial, já que a área afirma que a profissionalização do professor da infância ainda está em construção, ou como afirmam alguns autores ainda está sendo inventada . No caso da educação infantil não é possível concordar ou legitimar modelos feministas de domesticidade, de boa mãe, de mulher doce, ingênua, generosa, paciente – como sendo o único perfil para a construção da identidade do profissional da infância – o perfil profissional para além da “natureza feminina” é construído e constitutivo do processo formativo e no exercício profissional da docência. Desta maneira, acreditamos que somente uma formação consistente e teórico-crítica fornecerá subsídio para formar este profissional. Isto vai muito além do conhecimento do cotidiano imediato e da reflexão a partir da prática pedagógica.
Durante a década de 1990, o Ministério da Educação e Cultura /MEC empenhou-se na discussão e elaboração de uma Política Nacional de Educação Infantil. Podemos citar o documento Política de Educação Infantil, publicado em outubro de 1993, o qual aponta que o adulto que aturá na área deve ser reconhecido como profissional. A partir daí buscou-se assegurar melhores condições de trabalho para este profissional, plano de carreira, salário e formação condizente com seu papel profissional.
Acompanhando essa conquista legal, já em 1994, foi organizado um outro documento, proveniente de um Encontro Técnico de Formação do Profissional de Educação Infantil, com objetivo de fornecer subsídios para uma política de formação de profissionais de educação infantil. Este novo documento publicado com o título “Por uma política de formação do profissional de educação infantil” reuniu artigos referentes às conferências proferidas no seminário por pesquisadores convidados pela Coordenadoria Geral de Educação Infantil (COEDI), órgão vinculado ao Ministério da Educação, que vem apontando a necessidade de elaboração de um perfil próprio de formação do professor de educação infantil. Como podemos verificar a questão da profissionalização e da exigência de formação especifica para o professor de educação infantil no Brasil é recente.
Importa ressaltar que muitas das ações da formação do profissional da infância estavam voltadas para prover o Desenvolvimento infantil (e não Educação Infantil) e as estratégias de formação para este nível de educação historicamente voltou-se para o combate à pobreza ou a melhoria da eficácia do ensino fundamental. Os investimentos dos governos consideram a expansão sob a ótica de programas não-formais, a baixo custo, através da participação da comunidades com serviços voluntários.
Podemos considerar que a partir destes dispositivos cresce as pesquisas que se interessam em analisar a situação da formação de professores de educação infantil, bem como emergem muitas idéias sobre a necessidade de redefinir a função social das instituições de educação infantil. Segundo Raupp (2006, p.06) foi a partir de 1993 que as questões sobre a formação de professores em educação infantil entraram para a agenda dos pesquisadores, a autora analisa o caso catarinense. Afirma que a Universidade Federal e Santa Catarina/UFSC conta com a maioria das pesquisas, no universo entre 1993 até 2004 tive 89% dos estudos. Um dos aspectos que justifica a predominância do número de pesquisas na UFSC é o fato de esta universidade ter criado o primeiro programa de pés-graduação strito sensu em educação em Santa Catarina.
No âmbito nacional, toda a década de 1990 foi palco de grandes avanços na área da formação do professor de educação infantil. Principalmente a partir dos dispositivos e normalização subseqüentes a Constituição Federal de 1988 e da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional de 1996.
Nesse sentido, trazendo algumas contribuições na indicação de possíveis caminhos a serem trilhados na busca da defesa da formação como direito do professor. Destacamos para esta formação a relação teoria-prática, não no sentido da sobreposição da teoria sobre a prática e vice-versa, mas na mediação da prática pela teoria.
Deste modo, é importante refletir sobre os projetos de formação para profissionais docentes e não-docentes da Educação Infantil, sendo que, tais projetos devem estar relacionados tanto a uma formação estrita (referente ao trabalho cotidiano) quanto a uma formação ampla (referente ao saber historicamente acumulado pela humanidade). De acordo com Khulmann Jr. (2000), as propostas de trabalho para as crianças pequenas estão subordinadas aquilo que é pensado para as crianças maiores. Nestes termos, a especificidade da educação infantil não está na oposição à articulação com o ensino fundamental, ao contrário, esta articulação é imprescindível principalmente para as crianças da pré-escola que logo estarão na primeira série. Porém o ponto de partida para tal articulação não deve ser o ensino fundamental e sim a própria criança, o conhecimento sobre esse sujeito histórico-social.
É no sentido de buscar essa especificidade, que a formação específica do professor de Educação Infantil é fundamental, o que não necessita dispensar dessa formação as bases filosóficas, históricas, sociais e políticas que possibilitam o refletir, o planejar, implementar e avaliar o trabalho com/para as crianças. Já que sabemos que o trabalho nas creches e pré-escolas, com crianças entre 0 a 6 anos de idade exige do profissional que nele trabalha uma multiplicidade de ações de cuidado e educação das crianças.
Entretanto, há que se pensar nas questões práticas referentes a tais propostas de formação, no que se refere às condições objetivas de trabalho que nas instituições de educação que atendem às crianças em período integral, colocam-se antes como um problema do que como uma possível saída. Assim, segundo a pesquisa de Mezacasa (2003) tal problema torna-se visível e a autora nos mostra que a participação nos cursos de formação continuada não se estendia a todas as profissionais da educação, visto que as profissionais da pré-escola tinham prioridade de participação em relação às profissionais da creche. Tal situação reflete a concepção ainda vigente da creche como local de guarda e cuidado e que qualquer pessoa, sendo mulher, pode trabalhar nele sem que para isso tenha formação .
Vale ressaltar como reflexão para tal questão, a contribuição de Kramer (2002) que fala da atribuição que se dá ao trabalho do profissional da educação infantil como sendo de pouca qualificação e de menor valor, fruto de uma ideologia que camufla as precárias condições de trabalho, que esvazia o conteúdo profissional da carreira e desmobiliza os profissionais na reivindicação de seus direitos.
Assim, buscando as contribuições da perspectiva histórico-social urge a necessidade do professor se apropriar do saber historicamente construído para superar o cotidiano cristalizado, problematizando-o, e refletindo sobre ele. Contudo, partir de tal problematização requer a necessidade de uma instrumentalização que são os conhecimentos, as informações, os conceitos, as idéias, etc; na busca de respostas para as demandas práticas. Porém, é por meio da análise teórica e crítica que é possível a ruptura com o pensamento cotidiano por meio da reflexão crítica.
Diante destas propostas de formação, não podemos deixar de enfatizar, que a garantia de uma formação realmente possibilitadora da apropriação do conhecimento, na educação infantil, exige ainda não só a luta pelo direito à formação como também por condições concretas para a sua realização. A formação, nestes termos, exige que se parta da prática pedagógica, problematizando-a, para buscar a sua instrumentalização por meio da teoria e que responda as demandas práticas para se chegar a reflexão da prática social, resultando em mudanças reais nas concepções das profissionais, bem como, na educação e no cuidado das crianças de 0 a 6 anos. Tendo como parceira a universidade, como lócus a instituição e partindo da prática pedagógica das profissionais. Na complementação dessas indicações de possíveis caminhos, precisamos buscar também um intercâmbio entre as diversas instituições de educação da criança de 0 a 6 anos para que as trocas de experiências não se limitem ao espaço restrito de cada instituição e suas parcerias com a universidade, superando, dessa forma, o nosso olhar cristalizado sobre o cotidiano.

REFERÊNCIAS

ARCE, Alessandra. Compre o kit neoliberal para a educação infantil e ganhe dez passos para se tornar um professor reflexivo. In: Educação &Sociedade. Nº 74, p. 251- 283, abril. 2001.
ARCE, Alessandra. Pedagogia da Infância ou fetichismo da infância?. IN: DUARTE, Newton (org.) Critica ao fetichismo da individualidade. Campinas, SP: Autores Associados, 2004.
ARCE, Alessandra. A formação de professores sob a ótica construtivista: primeiras aproximações e alguns questionamentos. In: DUARTE, Newton. Sobre o Construtivismo. Campinas, SP: Autores Associados, 2000.
BRASIL, Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. 9394/96 de 20 de dezembro de 1996. Florianópolis: UFSC, Centro de Ciências da Educação, Núcleo de Publicações, 1999.
CERISARA, Ana Beatriz. A construção da identidade das profissionais de educação infantil: entre o feminino e o profissional. FEUSP, 1999. (tese de doutorado)
CARDOSO, Miriam Limoeiro. Questões sobre educação. IN: GOULART, Cecília (Org.) Dimensões e Horizontes da Educação no Brasil. Niterói, Rio de Janeiro: EdUFF, 2004.
CAMPOS, Maria Malta. Qualidade do Ensino Infantil. Fundação Carlos Chagas. 2005.
DUARTE, Newton. Educação escolar, teoria do cotidiano e a escola de Vigotski. Campinas, SP: Autores Associados, 1996.
DUARTE, Newton. Vigotski e o “aprender a aprender”: críticas às aproximações neoliberais e pós-modernas da teoria vigotskiana. Campinas: Autores Associados, 2000.
DUARTE, Newton. A individualidade para-si: contribuições a uma teoria histórico-social da formação do individuo. Campinas: Autores Asociados, 2000.
DUARTE, Newton (Org.) Critica ao fetichismo da individualidade. Campinas, SP: Autores Associados, 2004.
DUARTE, Newton. Educação escolar, teoria do cotidiano e a escola de Vigotsky. Campinas/SP: Autores Asociados, 1996.
FARIA, Ana Lucia Goulart, et. Al (Orgs.) Linguagens Infantis: outras formas de FACCI, Marialda G. D..Valorização ou esvaziamento do trabalho do profesor? Um estudo da teoria do profesor reflexivo, do construtivismo e da psicología vigotskiana. Campinas, SP: Autores Asociados, 2003.
KRAMER, S. Melhoria da qualidade do ensino: o desafio da formação de professores em serviço. Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos. Brasília; v. 70, nº 165, p. 189-207, maio/ago, 1999.
KRAMER, S. Currículo de Educação Infantil e a Formação dos Profissionais de Creche e Pré-escola: Questões Teóricas e Polêmicas. Brasil. MEC. SEF. COEDI. Por uma Política de Formação do Profissional de Educação Infantil. Brasília, MEC, p. 16-28, 1994.
KRAMER, S. Formação de Profissionais de Educação Infantil: questões e tensões. In: MACHADO, Maria L. de A. (org.) Encontros e desencontros em Educação Infantil. São Paulo: Cortez, 2002.
KHULMANN Jr., Moysés. Educação infantil e currículo. In: FARIA, A. L. G. de; PALHARES, M. S. (orgs.) Educação infantil pós-LDB: rumos e desafios. 2ª ed. Campinas, SP: Autores Associados, 2000.
MARX, Kart. Manuscritos económicos filosóficos e outros textos. São Paulo: Nova Cultural, 2002. (Coleção Os Pensadores).
MARTINS FILHO, Altino José (Org). Criança pede respeito: temas em educação infantil. Porto Alegre: Mediação, 2005.
MARTINS FILHO, Altino José et. all. Infância Plural: crianças do nosso tempo. Porto Alegre: Mediação, 2006, 120p.
MORAES, Maria Célia M.. Novas facetas de uma velha ideologia: o renovado conservadorismo da agenda pós-moderna. Florianópolis: PPGE/UFSC, 2004.
MEZACASA, Adriana K. H. Formação continuada o programa oficial sob o olhar das profissionais de educação infantil. (disser.) UFSC, 2003.
ROCHA, Eloísa Acires Candal. A pesquisa em educação infantil no Brasil: trajetória recente e perspectivas de consolidação de uma pedagogia da educação infantil. 1999.
SAVIANI, Demerval. Da nova LDB ao novo plano nacional de educação: por uma outra política educacional. 2ª ed. Campinas, SP: Autores Associados, 1985.
ROSSLER, João H.. Sedução e modismo na educação: processos de alienação na difusão do ideário construtivista. 2000. Tese (Doutorado em Educação Escolar) – Programa de Pós-Graduação em Educação Escolar da UNESP, Araraquara, SP.